O Superior Tribunal de Justiça (STJ) poderá definir, por meio de recurso com efeito repetitivo, uma questão importante para o setor agrícola: se existe o direito ao crédito presumido de PIS e Cofins sobre o beneficiamento de grãos vendidos para o exterior. O tema, que será analisado pela 1ª Seção da Corte, interessa, especialmente, um dos principais segmentos de exportadores brasileiros, o da soja.
Atualmente, há divergência sobre o assunto nos tribunais, inclusive no próprio STJ. Ministros das 1ª e 2ª Turmas da Corte já proferiram pelo menos 37 acórdãos e 187 decisões monocráticas em sentidos diversos.
“Há entendimentos pró-contribuinte, mas a jurisprudência é oscilante”, comenta o advogado Paulo Mothes, do escritório Sebastião Ventura Advogados. Ele representou no processo a Câmara Agroalimentos, que é autora do embargo de divergência que será analisado agora pela Corte superior, com efeito repetitivo (nº 1747725 – RS).
O Fisco considera que o benefício só é válido se o produtor realizar a industrialização do grão, transformando-o em óleo ou farelo, por exemplo. As empresas afirmam, por sua vez, que a exportação do grão também passa por um processo de beneficiamento e, por isso, teriam direito ao crédito presumido. Para a soja, a alíquota média de PIS e Cofins é de 4,625%.
“Quando as empresas remetem o grão para exportação tem o aprimoramento necessário e a preparação para capacitar ao consumo humano ou animal”, comenta o advogado Sebastião Ventura, dono de escritório que leva o seu nome.
O STJ negou provimento, por exemplo, ao recurso de uma empresa que pleiteava crédito presumido de PIS e Cofins por beneficiamento de grãos de soja, milho e trigo (nº 1817703). O tribunal de origem entendeu que a companhia não realiza a produção das mercadorias, fazendo só a classificação, pré-limpeza, secagem, limpeza, armazenamento e expedição dos grãos. Por outro lado, o STJ negou conhecimento a um recurso da União, mantendo o direito aos mesmos créditos (nº 1.715.983).
O presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, Paulo de Tarso Sanseverino, determinou a adoção do “rito de representação de controvérsia”. O recurso representativo de controvérsia é o processo escolhido entre vários outros com a mesma questão de direito, e que servirá como caso concreto paradigma para que o STJ fixe uma tese jurídica, tornando-a tema repetitivo.
“O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, não analisou o objeto dos embargos e reconheceu a divergência instalada na própria Corte, decidindo pela redistribuição do recurso”, explica Marcos Poliszezuk, sócio-fundador do Poliszezuk Advogados.
Na prática, por enquanto, as ações sobre o assunto correm normalmente. Isso porque ainda não houve deliberação de suspensão dos processos em curso. Mas se o STJ julgar o tema sob a sistemática de recursos repetitivos, a posição firmada será aplicada a todos os demais casos judiciais nos quais os cerealistas sejam parte, segundo a advogada Sarah Mila Barbassa, do escritório Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados.
Entre os cereais, a soja é um dos principais produtos de exportação brasileira. De acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento o complexo soja liderou as exportações do agronegócio em dezembro de 2021, com participação de 22,9% nas vendas totais do agronegócio ao exterior. E a soja em grão é o principal destaque das exportações. Em 2021, foram 6,628 milhões de toneladas de soja em grãos exportadas, segundo a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec).
O cerne da discussão está no termo “produzam”, contido no dispositivo que prevê o aproveitamento de crédito presumido de PIS e Cofins (Lei nº 10.925/2004). “O STJ, no julgamento de recursos especiais [nº 1.667.214/PR, 1.670.777/RS e 1.681.189/RS], concluiu que a produção a que se refere o artigo seria a de atividade industrial a partir dos grãos adquiridos, o que limitaria o aproveitamento de créditos somente pelas indústrias nacionais”, comenta a advogada Angela Selencovich Padilha, do escritório Souto Correa Advogados.
Porém, diz a advogada, o dispositivo não restringiu o termo “produção” à industrialização. Por isso, para ela, ele deveria abarcar toda a cadeia produtiva, inclusive as pessoas jurídicas que exercem atividades pré-industriais, como a secagem dos grãos que antecede a exportação.
Como a legislação não trouxe o conceito de produção, avalia o advogado Diogo de Andrade Figueiredo, do escritório Schneider Pugliese, “deveria valer uma interpretação mais ampla, e o beneficiamento dar o crédito do PIS e da Cofins”.
Já o advogado Rubens Ferreira Jr, da Advocacia Ubirajara Silveira, defende que deveria haver uma lei para apontar os parâmetros a serem considerados para determinar quem tem direito ao crédito de PIS e Cofins nesse setor. “O fato de estabelecer em repetitivo tal matéria vai auxiliar, mas não dirimir o problema. Se transfere ao Judiciário um problema que é do Legislativo, qual seja, estabelecer quais os critérios para ser ou não considerado ‘cerealista’”.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não retornou até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico
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