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Câmara Superior do Carf afasta IR sobre incorporação de ações

Foto de EKATERINA BOLOVTSOVA no Pexels
Decisão é a primeira que se tem notícia na última instância do tribunal administrativo

Uma decisão da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) reacendeu as esperanças dos contribuintes na discussão sobre a incidência de Imposto de Renda (IRPF) na incorporação de ações. A 2ª Turma afastou a tributação por entender que a operação não representa necessariamente um ganho patrimonial. É a primeira decisão que se tem notícia contrária ao entendimento da Receita Federal na última instância do tribunal administrativo.
 
A incorporação de ações está prevista na Lei das Sociedades Anônimas (nº 6.404, de 1976). É muito usada em operações de aquisição, principalmente quando o comprador quer manter a existência da empresa adquirida. Nesses casos, a empresa comprada se torna uma subsidiária integral e os seus sócios passam a ter participação na controladora.
 
Para advogados de contribuintes, trata-se de uma operação societária legítima, sem efeitos fiscais imediatos. A tributação não ocorreria no ato da incorporação, mas somente quando e se as ações forem vendidas no mercado.
 
Já a Receita Federal entende que, por envolver transferência de titularidade, essas operações têm de ser consideradas como alienação. E, sendo assim, cobra Imposto de Renda sobre o suposto ganho de capital gerado com o negócio.
 
Há poucos precedentes favoráveis aos contribuintes, tanto no Judiciário quanto no Carf (primeira instância) – mesmo depois das mudanças no critério de desempate, que ficou favorável às empresas. Em 2021, foram proferidas decisões na Justiça Federal de São Paulo contra a cobrança. Envolvem bancos e pessoas físicas.
 
A decisão da 2ª Turma da Câmara Superior do Carf foi publicada recentemente. No caso, a Receita Federal apurou irregularidades no Imposto de Renda recolhido por uma pessoa física em 2011. Passou a exigir a tributação sobre o suposto ganho de capital obtido pelo contribuinte com incorporação de ações (processo nº 10437.720962/2015-05).
 
Em junho de 2010, o contribuinte alienou a totalidade dos 50% das cotas que detinha em uma empresa vendida a outra. O pagamento se deu por meio do recebimento de parte do valor acordado em dinheiro e outra parte por meio da subscrição de 967.895 ações da compradora.
 
Em seu voto, a relatora do caso, conselheira Rita Eliza Reis da Costa Bacchieri, entendeu que a previsão de recebimento das ações equivalentes pelos titulares das ações incorporadas por si só não gera acréscimo patrimonial sujeito à apuração do ganho de capital. “O fato gerador (que gera a tributação) do Imposto de Renda da Pessoa Física é regido pelo regime de caixa e esse exige, além da disponibilidade jurídica ou econômica, a disponibilidade financeira do ganho auferido”, diz.
 
O que deve ser analisado, segundo a relatora, é em qual momento esse ganho é realizado para fins de incidência do Imposto de Renda. “A regra matriz de incidência do Imposto de Renda para a pessoa física possui como critério material o efetivo recebimento do ganho, não sendo possível tributar a mera expectativa da disponibilidade econômica de valores decorrentes de negócios jurídicos, até porque em alguns casos esse recebimento simplesmente pode não ocorrer.”
 
Para a maioria dos conselheiros da 2ª Turma, a incorporação de ações pode representar um ganho patrimonial ao contribuinte, mas só há motivo para tributar a partir do momento em que ocorrer a disponibilidade financeira do rendimento. Antes disso, há o risco de se tributar a “presunção de ganho”. Ficaram vencidos os conselheiros representantes da Fazenda.
 
O advogado do contribuinte Carlos Crosara, sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, alegou que a Receita Federal estava querendo tributar um ganho não realizado. Para ele, ocorreu apenas uma troca de papel na incorporação de ações. “O ganho tributado pelo auto de infração não havia sido realizado”, afirma. “A tributação deveria ocorrer no momento do ganho e não da incorporação.”
 
A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa em nota enviada ao Valor que essa decisão não representa a jurisprudência atual da 2ª Turma da Câmara Superior, tendo em vista que o voto da ex-conselheira Ana Paula Fernandes foi levado em consideração e determinou o resultado, em consequência do novo critério de desempate. Mas ela, acrescenta o órgão, não integraria mais a turma. A atual composição, ainda segundo a PGFN, tem entendimento favorável a sua tese, no sentido de que a incorporação de ações implica alienação e ganho de capital realizado para pessoas físicas.
 
A tributarista Ana Claudia Utumi, fundadora do escritório Utumi Advogados, afirma que os valores não devem ser entendidos como ganho até ser possível materializá-lo. Mas, geralmente, diz a advogada, não é assim que o Carf tem decidido. Ela lembra que a escolha pela alienação de cotas não tem apenas fins tributários. “Criar uma subsidiária integral facilita uma série de aspectos societários”, diz.
 
Fonte: Valor Econômico

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