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A transação tributária por adesão: avanço ou retrocesso?

Foto Freepik

Nova modalidade abre caminho para frustração das expectativas dos contribuintes

A transação tributária, em suas mais variadas modalidades, de forma inequívoca, vem demonstrando ser um instrumento de arrecadação eficiente, justo e que atende tanto aos objetivos de cobrança da dívida ativa quanto às necessidades dos contribuintes. Trata-se de política pública em constante aprimoramento, sempre inovando na resolução de conflitos tributários para redução do estoque de créditos e de execuções fiscais.

Após o encerramento das diversas modalidades de transações tributárias por adesão, ocorrido em 30/12/2022, contribuintes aguardavam a disponibilização de novas possibilidades de regularização do seu passivo tributário, já que 2023 inicia apenas com a vigência das transações individual, e individual simplificada – destinada aos devedores cujo passivo supere R$ 1 milhão.

Nesse sentido, já em 18 de janeiro foi publicado o Edital PGDAU 1/2023, reservado aos devedores do Simples Nacional, cuja adesão esteve disponível até o dia 31 de janeiro. A fim de atender aos demais casos, bem como viabilizar a arrecadação tributária, a PGFN publicou o Edital PGDAU 2/2023, que trata, em síntese, da instituição de três novas modalidades de transação por adesão, quais sejam: (i) transação por adesão na cobrança da dívida ativa da União; (ii) transação do contencioso de pequeno valor relativo ao processo de cobrança da dívida ativa da União; e (iii) transação de inscrições garantidas por seguro garantia ou carta fiança. O presente artigo visa analisar a modalidade por adesão na cobrança da ativa da União, que parece ter vindo para substituir as opções antes denominadas de excepcional e extraordinária.

Apesar da similaridade com as transações por adesão anteriores, é possível inferir uma redução expressiva de benefícios outrora concedidos para equalização do passivo fiscal. Isso porque, de pronto, já se percebe que as condições de pagamento são mais desvantajosas quando comparadas com aquelas das transações excepcional e extraordinárias, ou até mesmo com os termos de negociações de transação individual. Importante ressaltar que o edital em comento é endereçado aos devedores com passivo de até R$ 50 milhões.

Na transação excepcional, exigia-se uma entrada de 4% do valor consolidado do débito, que poderia ser parcelada em até 12 meses. A nova transação, por sua vez, prevê o pagamento de uma entrada de 6% do valor do total devido, sendo que esse montante poderá ser parcelado em apenas seis meses. Além disso, aos contribuintes cujos créditos eram classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, e requeriam a dilação máximo para pagamento (120 meses), era permitida a concessão de até 100% de descontos em juros, multas, e encargos legais, limitados a 35% do valor do débito.

Na nova transação, esse limite será reduzido para 20% do montante devido, o que implicará em significativa diminuição dos descontos concedidos. Pelo menos nesta modalidade, as parcelas não serão determinadas em função do maior valor entre 1% da receita bruta do mês anterior ou da divisão do valor consolidado, tal como era na transação excepcional, o que trazia imprevisibilidade e prejuízo ao cumprimento do plano. Agora, o contribuinte saberá o montante de cada prestação no momento da adesão, uma vez que as parcelas são fixadas apenas com base na divisão do saldo remanescente, mensalmente atualizadas pela taxa Selic.

Enquanto a transação extraordinária permitia a regularização dos créditos de alta ou média perspectiva de recebimento, em até 120 meses, o edital em análise prevê prazo de pagamento idêntico ao de um parcelamento convencional, uma vez que limita em 54 meses a quitação do saldo remanescente – tal alteração não deixa dúvida quanto a intenção de restringir o uso desta política pública para aqueles que, no entender da Fazenda Nacional, possuem maior capacidade de pagamento.

Outro aspecto negativo é que o Edital PGDAU 2/2023, assim como as transações por adesão anteriores e a individual simplificada, mantêm a vedação de uso de créditos decorrentes de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL para amortização do saldo devedor, tornando a nova modalidade ainda menos atrativa para regularização de passivo superior a R$ 10 milhões.

A nova proposta também é desvantajosa para contribuintes com débitos de mais R$ 1 milhão, pois, ainda que estes não possam usufruir do benefício da utilização do prejuízo fiscal e base de cálculo negativa, lhes é permitido propor um plano de pagamento customizado, de acordo com o seu fluxo de caixa, por meio da transação individual simplificada. Ademais, por se tratar de uma proposta por adesão, não faculta ao proponente a apresentação de um plano de regularização fiscal diferenciado, que atenda às necessidades de cada devedor. A este cabe apenas aceitar todas as condições fixadas pela PGFN.

Por isso, a proposta do edital em questão, como meio alternativo de resolução de conflitos em matéria tributária, é uma modalidade que frustra as expectativas de contribuintes e operadores do Direito, justamente por não permitir uma composição bilateral. Nesta, assim como na excepcional e extraordinária, não há qualquer tipo de negociação entre os representantes do fisco e do devedor, nem mesmo de forma assíncrona, como ocorre na transação individual simplificada.

Infelizmente, a modalidade de transação prevista neste edital, que poderia ser importante ferramenta para desafogar o elevado número de requerimentos de transações individuais, tende a ter baixa adesão, vindo a socorrer apenas os contribuintes cujos créditos tributários sejam de até R$ 1 milhão. Apesar de demandar mais prazo para ser concretizada, as transações individuais e individuais simplificadas são opções muito mais interessantes aos contribuintes cujos créditos nestas consigam acessar.

As novas condições ofertadas, especialmente de majoração do valor da entrada e redução de descontos para optantes do prazo máximo de pagamento, representam um retrocesso para o instituto que tanto avançou nos últimos três anos, e que vem se consolidando como o principal meio de resolução de passivos fiscais no Brasil.

Entretanto, diante da ausência de alternativa mais benéfica, a opção ofertada no Edital 2/2023 é, sem sombra de dúvida, a única oportunidade de regularização para devedores com baixa capacidade de pagamento e que não podem acessar as demais modalidades.

Por: Jussandra Hickmann Andraschko e Mariana Rodrigues

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