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Carf libera concessionária de veículos de pagar PIS e Cofins

Foto Freepik

Precedente afasta a tributação de valores devolvidos por montadoras

Concessionárias de veículos conseguiram, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), um precedente contra a tributação de valores devolvidos por montadoras — uma prática comum no mercado, chamada de “hold back”. A decisão, da 2ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção, permite ao contribuinte levar a questão à Câmara Superior, a última instância do órgão.

Ao adquirir veículos da uma montadora para revenda, as concessionárias costumam pagar um adicional, que vai de 1% a 1,5% do preço desses automóveis, para um fundo de aplicação administrado pela fabricante. Esse fundo serviria para garantir uma margem de negociação das concessionárias com os clientes finais. Depois, esse valor é devolvido, com juros em um intervalo determinado conforme a política de cada fabricante. É sobre essas devoluções que a Receita cobra PIS e Cofins.

O órgão considera que o valor restituído a título de “hold back” seria uma espécie de bonificação — que é considerada receita e, portanto, tributável. Para as concessionárias, porém, não haveria novo ingresso de valor, mas sim uma devolução de quantia paga anteriormente.

O tema foi julgado em autuação fiscal recebida pela Iesa Veículos, que revende carros da marca Renault no Rio Grande do Sul. Além da prática do “hold back”, os conselheiros discutiram a tributação de descontos sobre veículos dados para abatimento de despesas compartilhadas (processo nº 11080.730216/2016-42).

Por unanimidade, os conselheiros afastaram a natureza de receita de reembolsos relativos a despesas com publicidade, emplacamento e treinamento, entre outros. No caso do “hold back”, a tributação foi derrubada por maioria de votos — com placar de seis a dois.

Prevaleceu o voto do relator, conselheiro Jorge Luís Cabral. Para ele, o desconto dado sobre os veículos, relativo a essas despesas, não pode ser tratado como bônus de desempenho ou de produtividade. Seria apenas parcela redutora do custo da mercadoria vendida — o mesmo entendimento foi aplicado ao “hold back”.

A Iesa, acrescentou, assume os riscos comerciais e operacionais ao adquirir a propriedade dos veículos negociados, diferentemente do que acontece no penhor mercantil. Nessa modalidade, as operações são sempre de vendas diretas da fábrica para os clientes finais.

Em seu voto, ele levou em consideração ainda que a concessionária se enquadra no regime monofásico — a apuração de PIS e Cofins se concentra em um único contribuinte, em geral no início da cadeia. “Não pode haver repercussão tributária na recomposição de custos de mercadorias vendidas, no caso de monofasia, para o mercado de veículos automotores”, afirmou o relator.

Cabral cita, no voto, que a Receita motiva a autuação pelo simples fato de que reembolsos não constam da lista excludente da legislação de PIS e Cofins. Mas, para o conselheiro, não cabe atribuir o conceito de receita pela sua ausência de uma operação específica. O ingresso analisado, acrescentou, precisa enquadrar-se no conceito de receita, conforme as Leis nº 10.637, de 2002 e nº 10.833, de 2003.

Contexto e análise
No Carf, essa é a primeira decisão favorável aos contribuintes sobre “hold back”, segundo Leandro Cabral, sócio do Velloza Advogados. O precedente possibilitará que o assunto chegue à Câmara Superior, o que poderá alterar o entendimento das demais turmas do órgão. “A decisão considera a realidade da operação entre montadoras e concessionários, onde a prática da recuperação de custo é essencial à viabilidade do negócio”, afirma.

O que sensibilizou os julgadores no Carf, diz o advogado, foi que há retenção de um valor que será devolvido e creditado à concessionária. “Existem decisões desfavoráveis em que acabam confundindo essa figura com a da bonificação em mercadorias. Acabam se apegando ao nome bônus e ignorando se há característica de bônus”, afirma.

O que sensibilizou os julgadores no Carf, diz o advogado, foi que há retenção de um valor que será devolvido e creditado à concessionária. “Existem decisões desfavoráveis em que acabam confundindo essa figura com a da bonificação em mercadorias. Acabam se apegando ao nome bônus e ignorando se há característica de bônus”, afirma.

O advogado reconhece que a sistemática de “hold back” tem alguma similaridade com a figura da bonificação do varejo. “Mas não seria a mesma coisa”, diz.

Jurisprudência
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), as duas turmas que julgam o tema estão divididas sobre a tributação de bonificações. Recentemente, a 2ª Turma entendeu que incide PIS e Cofins sobre bonificações e descontos obtidos pelo varejo na aquisição de mercadorias (REsp 2090134), divergindo de posicionamento da 1ª Turma (REsp 1836082).

Na segunda instância, a tributação de “hold back” também divide os julgadores. Há precedente favorável aos contribuintes na 2ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região (processo nº 0807864-63.2019.4.05.8100) e desfavorável na 3ª Turma da mesma Corte (processo nº 0819381-02.2018.4.05.8100) e no TRF da 4ª Região (processo nº 5014845-14.2012.404.7200).

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) considera que os valores retidos pelas montadoras, a título de “hold back”, na verdade representam uma parte da margem de lucro das concessionárias. “Quando as montadoras remuneram as concessionárias com as verbas denominadas hold back, esses recursos constituem receitas para as concessionárias, que irão integrar o seu resultado e devem compor a base de cálculo do PIS e da Cofins”, afirma o órgão em nota ao Valor.

A PGFN acrescenta que, no Carf, a maioria dos precedentes indicam a possibilidade de tributação, por meio do PIS e da Cofins, das receitas decorrentes das operações de “hold back”.

Fonte: Valor Econômico

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