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Liminar libera transação simplificada a shopping

Foto Freepik

Juiz autorizou uso de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL

Um shopping do interior de São Paulo obteve decisão liminar para negociar o pagamento de dívidas tributárias com a União utilizando créditos de prejuízo fiscal e de base negativa de CSLL. Com débitos de cerca de R$ 9 milhões, o contribuinte quer aderir à transação simplificada, modalidade em que a Fazenda Nacional veda o uso desses créditos.

A possibilidade, segundo estimativa do contribuinte, reduzirá o montante devido para cerca de R$ 2 milhões. Trata-se do primeiro precedente sobre o assunto, segundo advogados tributaristas consultados pelo Valor.

Na liminar, o juiz federal Joaquim Alves Pinto, da 1ª Vara Federal de Bauru (SP), entendeu que a restrição ao uso do prejuízo fiscal para grupos determinados violaria a isonomia entre contribuintes. Para ele, isso também seria ilegal porque não consta na Lei da Transação (nº 13.988, de 20220), mas só na Portaria nº 6.757/2022, editada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Cabe recurso.

A Fazenda Nacional instituiu três modalidades de transação: por adesão, individual e individual simplificada. Esta última é voltada para contribuintes com dívidas de R$ 1 milhão até R$ 10 milhões. O artigo 37 da portaria veda o uso de prejuízos fiscais e base negativa de CSLL para abater os débitos em transações simplificadas e também por adesão.

Apenas contribuintes com dívidas superiores a R$ 10 milhões estão autorizados a usar esses créditos – até o limite de 70% do saldo remanescente após a incidência dos descontos.

“Esta norma regulamentar, ao que claramente se vê, é ilegal e anti-isonômica, na medida em que veda a dois grupos de contribuintes o direito de transacionar com a Fazenda Nacional nas mesmas condições ofertadas a um terceiro grupo (que se enquadram na transação individual)”, afirma o magistrado na decisão (processo nº 5001050-57.2023.4.03.6108).

A discussão é relevante, segundo advogados, porque a possibilidade de uso de prejuízo fiscal como “moeda” para amortizar dívidas tributárias é vista como um grande benefício nas transações com a União. Evita, na prática, desembolso de dinheiro do caixa para quitação dos débitos.

No caso do shopping que recorreu ao Judiciário, o impacto é significativo, de acordo com o advogado Ruy Fernando Cortes de Campos, do escritório Maia & Anjos Advogados, que representa o contribuinte na ação. “Foi muito afetado pela pandemia da covid-19 e acumulou prejuízo considerável nos últimos anos”, afirma.

A banca simula que, com o uso dos créditos de prejuízo e os descontos legais aplicáveis, a dívida do contribuinte inscrita em dívida ativa seria reduzida de R$ 9 milhões para cerca de R$ 2 milhões. “Que poderia ser parcelado”, diz o advogado.

Apenas com a aplicação dos descontos e sem a possibilidade do uso de prejuízo fiscal, a dívida ficaria em aproximadamente R$ 6 milhões. “Não faz o menor sentido fazer essa diferenciação entre os contribuintes”, afirma Campos.

Além de autorizar o uso de prejuízo fiscal, o juiz, na liminar, suspendeu a cobrança do débito tributário sob a condição de a empresa pedir a adesão à transação simplificada.

Tributaristas consultadas pelo Valor consideram a decisão um bom precedente para contribuintes na mesma situação, mas fazem ressalvas. Afirmam que, pelo desenho atual da transação tributária, o uso de créditos de prejuízo fiscal e base negativa é a última moeda aceita pela Fazenda e pela Receita Federal para a quitação de débitos.

Maria Andréia dos Santos, sócia do contencioso tributário do Machado Associados, aponta que o artigo 11 da Lei 13.988 indica os benefícios que poderão – e não deverão – ser concedidos na transação. Segundo ela, foi dado discricionariedade para a Fazenda e a Receita nesse ponto.

“Poderá é faculdade, mas entendo que a procuradoria deveria buscar conferir tratamento igualitário aos contribuintes. Deixar os enquadrados na transação simplificada de fora do uso do prejuízo é conferir tratamento anti-isonômico. Mas se não queremos ficar sujeitos a essa discricionariedade, precisa haver uma alteração na lei”, diz.

Andréa Mascitto, sócia do escritório Pinheiro Neto, pondera haver outros requisitos previstos na portaria da PGFN para uso do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL e que não foram analisados na decisão judicial.

A norma, no artigo 36, estabelece que o uso desses créditos será excepcional, quando demonstrada a imprescindibilidade para a composição do plano de regularização. Além disso, prevê que só será cabível em relação a créditos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação.

Para a advogada, a decisão deixou de analisar se esses requisitos da portaria foram cumpridos pelo contribuinte. Ou se deveriam ser afastados por ilegalidade, já que não constam na lei.

“O pedido fundado no princípio da isonomia é válido e faz sentido acionar o Judiciário. Mas deve haver precaução para fechar todas as lacunas sobre os demais requisitos para uso do prejuízo”, afirma.

Em nota enviada ao Valor, a PGFN diz que a decisão “acaba por infringir um dos pilares da transação que, como instrumento de negociação, deve respeitar os limites legais, cabendo à PGFN estabelecer as condições a serem observadas pelos interessados”.

A Fazenda Nacional afirma ainda que não tem se deparado com discussões semelhantes. “Sendo firme sua convicção de que a referida decisão, por encontrar-se divorciada das balizas do modelo de transação federal, que tem tido tanto êxito na recuperação das empresas, será reformada pelo TRF-3 [Tribunal Regional Federal da 3ª Região]”, diz.

Fonte: Valor Econômico

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