Para Receita, tais gastos não estão relacionados ao processo de prestação e serviços em questão e não são insumos
A Receita Federal se manifestou contra o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins sobre gastos com a implementação da Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados, ou LGPD) no caso de uma empresa da área financeira. O entendimento consta na Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 307, publicada no dia 14 de dezembro.
O entendimento da Receita é de que tais gastos não estão relacionados ao processo de prestação de serviços em questão, constituindo-se, assim, em despesas, e não em insumos.
Na Solução de Consulta Cosit 307, a Receita destaca que a LGPD não é uma norma direcionada especificamente ao sistema financeiro, “porquanto seu objetivo é regular a forma pela qual os dados são utilizados nos mais diversos setores da sociedade”.
O texto foi feito em resposta ao questionamento de uma empresa da área financeira, que oferta serviços de pagamento por meio de plataforma digital acessível por site ou aplicativos disponíveis para telefones celulares.
A Receita diz ainda que as despesas com a implementação da lei não não se amoldam ao conceito de insumo definido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do REsp 1.221.170, uma vez que não são essenciais ou relevantes para o desenvolvimento da atividade da empresa.
No REsp 1.221.170 o STJ definiu, sob o rito dos recursos repetitivos, os critérios que definem o que pode ser considerado insumo para PIS e Cofins. Naquela oportunidade, a Corte pacificou o conceito de insumo, que deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade e da relevância; considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
As soluções de consulta Cosit possuem efeito vinculante no âmbito da Receita Federal, ou seja, são de observância obrigatória por agentes do órgão, como fiscais. Com exceção da empresa que fez a consulta, outros contribuintes não estão vinculados à solução de consulta, porém o texto expressa a forma de pensamento da Receita em relação ao tema.
É a primeira vez que a Receita se manifesta, por meio de solução de consulta, sobre a tomada de créditos de PIS e Cofins sobre gastos com a LGPD. Há, ainda, algumas decisões judiciais sobre o tema, porém sem posições dos tribunais superiores.
David Gonçalves de Andrade Silva, sócio da Andrade Silva Advogados, discorda da solução de consulta, e afirma que a discussão tem origem na “falsa não cumulatividade do PIS e da Cofins”.
“Isso visto que o elenco enorme de limitações ao aproveitamento de créditos, como no caso dos gastos para implementação da LGPD, servem mesmo para desdizer o princípio que deveria ser o natural, em qualquer sistema não cumulativo. Ou seja, tudo o que é gasto, custo, despesa ou investimento, independentemente de estar ligado ao não, diretamente, ao produto fabricado, comercializado ou ao serviço prestado, deveria, sim, gerar direito ao crédito”, destaca o advogado.
Paulo Henrique Gomes de Oliveira, tributarista do Ferrareze e Freitas advogados, também discorda da solução de consulta. Para o advogado, a Receita Federal se equivocou ao se manifestar no sentido de não ser uma norma direcionada ao setor financeiro, pois tais empresas precisam preservar os dados dos seus clientes.
“Portanto, inegável dizer que as despesas para cumprimento das normas de LGPD por tais empresas são fundamentais, obedecendo-se, assim, ao posicionamento do STJ que conferiu direito a crédito de PIS e Cofins sobre despesas essenciais e relevantes dessa natureza”, diz. “Certamente, esse tema ainda continuará a ser palco de discussões no Judiciário para que as empresas possam garantir o direito ao uso dos créditos de PIS e Cofins sobre despesas para a implementação da LGPD.”
Já Letícia Sugahara, advogada tributarista no Mannrich e Vasconcelos Advogados, aponta que apesar de ser uma manifestação inédita da Receita Federal em relação ao tema, seu posicionamento está em linha com o entendimento adotado pelo órgão para outros gastos decorrentes de imposição legal.
“Muito embora represente uma manifestação desfavorável, entendemos que os contribuintes têm fundamentos jurídicos e fáticos sólidos para suportar o aproveitamento de crédito de PIS e Cofins sobre referidos gastos, especialmente em razão de estarem sujeitos à aplicação de penalidades caso deixem de aplicar a LGPD à totalidade de suas atividades”, ressalta.
Fonte: Jota