O ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), atendeu pedido de uma empresa para deixar de recolher contribuição previdenciária sobre a chamada Hora Repouso Alimentação (HRA). Tratam-se de valores que têm de ser pagos ao empregado quando ele trabalha ou fica à disposição do empregador durante o período de intervalo.
É a primeira decisão favorável aos contribuintes que se tem notícia na Corte. A 1ª Seção, que uniformiza o entendimento a ser adotado nas turmas de direito público, decidiu sobre esse tema em 2020, mas em sentido contrário – ou seja, pela tributação desses valores.
A discussão, naquela ocasião, se deu em torno da natureza dos pagamentos: se indenizatória ou remuneratória. Há jurisprudência consolidada no STJ e no Supremo Tribunal Federal (STF) de que a contribuição patronal tem de ser recolhida somente sobre as verbas de caráter salarial. O que for considerado indenização, portanto, fica livre de tributação.
Consta na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que quando o período para repouso e alimentação não for concedido, a empresa tem de remunerar o funcionário pelo tempo correspondente com o acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da hora normal de trabalho. Esses pagamentos são comuns em empresas de segurança, clínicas médicas e no setor petroquímico.
A 1ª Seção, quando julgou o tema, considerou uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a de nº 437, que trata esses valores como de natureza salarial. E, sendo assim, aplica-se a tributação. Os ministros frisaram, porém, que esse entendimento vale para casos anteriores à reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017).
É que com a reforma passou a constar de forma expressa na legislação que os valores referentes à HRA têm caráter indenizatório. Em tese, portanto, a discussão em torno da tributação desses pagamentos estaria encerrada dali para frente.
“Esperava-se que o Judiciário alterasse o entendimento que até então vinha sendo adotado, mas não foi isso que se viu por parte das instâncias inferiores”, diz Rodrigo Petry, do escritório Almeida Advogados.
Empresas que entraram na Justiça de forma preventiva, com medo de serem cobradas mesmo existindo uma nova lei, encontraram resistência. No caso analisado por Herman Benjamin, por exemplo, a Praxxis, uma prestadora de serviços de São Paulo, teve o pedido negado tanto na primeira como na segunda instâncias.
O juiz e os desembargadores haviam aplicado o precedente da 1ª Seção – mesmo para período posterior à reforma trabalhista. Só agora, com a decisão de Herman Benjamin, é que a companhia se viu livre da tributação. O ministro analisou o caso pouco antes do recesso (REsp 1963274).
Ele afirma, na decisão, que no julgamento de 2020 ficou claro que a contribuição não pode ser exigida em período posterior à reforma. “Esta Corte Superior já pacificou o tema jurídico em exame”, diz Benjamin.
Para o advogado Guilherme Coelho, do escritório CH Law, que representa a empresa no caso, a decisão do ministro Herman Benjamin é importante porque serve como esclarecimento. Pode ter efeito sobre juízes e desembargadores, diz ele, que hoje aplicariam o precendente da 1ª Seção de forma equivocada.
“É um tema de impacto econômico significativo. Especialmente para as prestadoras de serviço que têm um número grande de trabalhadores. A contribuição previdenciária é calculada sobre a folha de salários, são cerca de 27%, e os valores pagos de HRA, se exigida a tributação, comporiam o cálculo”, afirma.
Segundo pesquisa feita pela advogada Érika Ferraciolli, do escritório Orizzo Marques, no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo, há uma única decisão favorável às empresas. Foi publicada em setembro por meio de embargos de declaração, ou seja, corrigindo a decisão tomada inicialmente.
Os desembargadores tinham aplicado o precedente da 1ª Seção do STJ para período posterior à reforma trabalhista (processo nº 5004466-61.2019.4.03.6144). “Existem inúmeras decisões nesse mesmo sentido. Esperamos, agora, que se inicie um movimento pela aplicação adequada desse precedente”, diz a advogada.
Érika Ferraciolli afirma que as empresas precisaram entrar com ações para se precaver de futuras cobranças do tributo – mesmo com a mudança na lei – por causa da jurisprudência contrária e porque o eSocial não havia acompanhado a mudança. Não existia, no sistema, um recorte de tempo (pré e pós-reforma).
Além disso, segundo o advogado Pedro Ackel, do escritório WFaria, havia dúvida por parte das empresas de como a Receita Federal interpretaria o tema. É que os pagamentos referentes à HRA não constam nas exceções previstas no artigo 28, parágrafo 9º, da Lei nº 8212, de 1991, que trata sobre a tributação da folha de pagamento.
“A reforma mudou a lei trabalhista, mas não a legislação tributária. Havia receio porque a Receita Federal costuma fazer uma interpretação bastante restritiva”, afirma o advogado.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) foi procurada pelo Valor para comentar o tema, mas não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico
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