1ª Seção entendeu que ICMS deve ser mantido no cálculo do IRPJ e CSLL recolhidos por empresas no regime do lucro presumido
A União venceu, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), mais uma valiosa discussão tributária – avaliada em R$ 2,4 bilhões. Envolve empresas que recolhem Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL pelo regime do lucro presumido. Os ministros decidiram pela inclusão do ICMS na base de cálculo desses tributos federais.
Trata-se de uma “tese filhote” da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins – a chamada “tese do século”, concluída pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano de 2021, que gerou bilhões em créditos fiscais.
Se, nesse caso, os ministros tivessem seguido a mesma linha adotada pelo STF, permitindo a exclusão do ICMS, as alíquotas de IRPJ e CSLL seriam aplicadas sobre uma base menor e, consequentemente, as empresas pagariam menos tributos ao governo federal. Poderiam, além disso, recuperar os valores que foram pagos nos últimos cinco anos.
Com a decisão contrária, no entanto, a situação se inverte: a Receita Federal pode exigir os valores das empresas e também cobrar, com multa e juros, o que deixou de ser pago em anos passados.
O julgamento ocorreu ontem na 1ª Seção e tem efeito vinculante (REsp 1767631 e REsp 772470). A decisão deve ser replicada a todos os processos que estão na primeira e segunda instâncias e também nas duas turmas que julgam as questões tributárias no STJ – 1ª e 2ª.
Estão no regime do lucro presumido – e serão afetadas pela decisão – as empresas com faturamento anual de até R$ 78 milhões. Nessa modalidade, a apuração do IRPJ e da CSLL é feita de forma simplificada.
As companhias aplicam um percentual previsto em lei (que varia conforme os setores) sobre o faturamento bruto e o resultado serve de base para a incidência dos tributos.
A discussão, no STJ, era se os valores correspondentes ao ICMS que constam nas notas fiscais dos produtos e são repassados pelas empresas aos governos estaduais poderiam ser considerados receita bruta e contabilizados para fins de IRPJ e CSLL.
Advogados de contribuintes sustentam que, no julgamento da “tese do século”, o Supremo disse que ICMS pertence a terceiros – os Estados – e não poderia, por esse motivo, ser enquadrado como faturamento ou receita bruta, que serve de base de cálculo para PIS e Cofins.
“Se não é receita própria da empresa, então também não pode ser para fins de IRPJ e CSLL, sob pena de afronta à capacidade contributiva ao tributar o que sequer é receita do contribuinte”, diz Ricardo Elias Chahine, do escritório Bonaccorso, Cavalcante, Oliveira e Ristow Sociedade de Advogados, que representa empresa envolvida em um dos processos analisados no STJ.
A alegação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por outro lado, é a de que o STF não retirou qualquer tributo pago pelo contribuinte da receita bruta. A decisão da “tese do século”, portanto, não poderia ser automaticamente aplicada para outras situações.
Esse julgamento teve início em outubro do ano passado – e os contribuintes largaram na frente. A relatora, ministra Regina Helena Costa, votou para que as empresas do lucro presumido pudessem excluir o ICMS do cálculo do IRPJ e da CSLL.
“Receita não pode ser uma coisa para um tema e ter outro conteúdo para outro tema”, afirmou na ocasião, dando razão aos contribuintes de que o STF já havia decidido o que é receita e excluído o ICMS. “Não podemos criar outro conceito.”
Mas não conseguiu convencer os demais julgadores. O julgamento, ontem, foi retomado com o voto-vista do ministro Gurgel de Faria, que divergiu e foi acompanhado por todos os demais ministros que participaram da votação – Herman Benjamin, Mauro Campbell, Benedito Gonçalves e Assusete Magalhães.
Gurgel afirmou, em seu voto, que o STJ analisa as questões com base na legislação federal e a lei determina, expressamente, que o valor do ICMS integra a receita para fins de tributação de IRPJ e CSLL no regime do lucro presumido.
“A adoção da receita bruta como eixo da tributação do lucro presumido demonstra a intenção do legislador de impedir quaisquer deduções, tais como impostos, custos das mercadorias ou serviços, despesas administrativas ou financeiras, tornando bem mais simplificado o cálculo dos referidos tributos”, disse.
O percentual de presunção – que se aplica sobre a receita bruta para chegar a base de incidência do IRPJ e da CSLL -, acrescentou o ministro, estabelece a margem de lucro da atividade e também acaba por presumir o percentual de despesa dessa mesma atividade. “E o ICMS é uma dessas despesas”, frisou.
Para Gurgel, a exclusão do ICMS, como querem os contribuintes, acabaria permitindo uma combinação do lucro presumido e do lucro real. As empresas que recolhem IRPJ e CSLL pelo lucro real calculam todas as suas receitas e todas as suas despesas para encontrar a base dos tributos e o ICMS pode ser abatido.
Os contribuintes ainda podem apresentar embargos de declaração contra essa decisão. Com esse recurso não se consegue modificar o mérito. É usado para esclarecer dúvidas, omissões e obscuridades.
“Fato é que o IRPJ e a CSLL continuarão sendo exigidos sobre o ICMS pago pelas empresas comerciais e industriais, o que, na nossa visão, desafia o pronunciamento final do STF”, diz Thiago Francisco Ayres da Motta, sócio do escritório Castro Barros Advogados.
Eduardo Suessmann, sócio do Suessmann Advogados, chama atenção, além disso, que essa mesma decisão deve ser replicada pelos ministros às discussões que tratam sobre a inclusão do ISS no cálculo do IRPJ e da CSLL das empresas do lucro presumido. “Porque já estavam suspendendo os casos que tratavam dessa matéria para aguardar o julgamento do ICMS”, afrima.
A batalha das “teses filhotes” tem sido bastante dura para os contribuintes. Está difícil de emplacar no STJ e também no STF.
Além do julgado de ontem, o STJ havia, anteriormente, decidido contra excluir a Contribuição Patronal sobre a Receita Bruta (CPRB) do cálculo do PIS e da Cofins. O STF, por sua vez, já se posicionou contra as exclusões do ICMS e do ISS da base da CPRB.
Fonte: Valor Econômico