REINTEGRA: SAIBA COMO UMA DISCUSSÃO JUDICIAL PODE LEVAR AO AUMENTO DO PERCENTUAL DO REINTEGRA DE FORMA PERMANENTE PARA, NO MÍNIMO, 3%.

  1. INTRODUÇÃO

O Regime especial de reintegração de valores tributários para empresas exportadoras – REINTEGRA é, ou deveria ser, um importante instrumento para auxiliar às empresas exportadoras brasileiras a ter competitividade no mercado externo. A Lei instituidora do REINTEGRA confere ao Poder Executivo a tarefa de fixar o percentual do REINTEGRA, o qual incidirá sobre o valor das receitas de exportação.

Ocorre que, atualmente, tal percentual corresponde a míseros 0,1%. Ou seja, pode-se afirmar que hoje essa importante ferramenta para dar competitividade às empresas exportadoras é irrisória. No entanto, é possível recorrer ao Poder Judiciário para buscar a modificação de tal percentual. Existem sólidos argumentos jurídicos para sustentar que o percentual aplicável deve ser aquele que reflita a real desoneração da cadeia produtiva exportadora, podendo superar, inclusive, os 3% anteriormente fixados pelo Poder Executivo.

Para compreender as razões pelas quais os contribuintes possuem grandes chances de aumentar o percentual do REINTEGRA, primeiramente, é necessário entender o contexto que levou à instituição do REINTEGRA. Nessa linha, é importante analisar o cenário da tributação envolvendo as empresas exportadoras.

  • O SURGIMENTO DO REINTEGRA

Buscando assegurar a competitividade das empresas brasileiras no mercado externo e assegurar o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CF), o Constituinte consagrou a desoneração da cadeia produtiva dirigida à exportação. Nesse sentido, é possível observar que ao legislador infraconstitucional não foi outorgada competência para instituição de IPI (art. 153, § 3º, III, da CF), ICMS (art. 155, § 2º, X, a, da CF), ISS (art. 156, § 3º, II, da CF) e PIS/ COFINS (art. 149, § 2º, I, da CF) sobre as operações envolvendo exportação.

Tais imunidades tributárias buscam concretizar o princípio do país destino. Sobre o tema, SCHOUERI assevera que “a imunidade às exportações se explica a partir da decisão do constituinte brasileiro – seguindo tendência universal – de o País adotar, em suas relações internacionais, o princípio do destino na tributação do consumo.” [1]

Ocorre que, apesar das desonerações presentes na Constituição Federal e da inegável introdução do princípio do país do destino em nosso ordenamento jurídico, a cadeia produtiva exportadora ainda convive com resquícios da tributação em cascata característica do sistema tributário brasileiro.

Diante desse cenário, em 2011, foi instituído pela primeira vez o REINTEGRA. Analisando a exposição de motivos da Medida Provisória que o instituiu, constata-se que o REINTEGRA foi criado com o objetivo de contornar as dificuldades encontradas pelas empresas brasileiras exportadoras de competir em igualdade de condições em um ambiente de competição cada vez mais acirrada, o que justifica sua urgência e relevância. O prazo de vigência do REINTEGRA findava-se em 31 de dezembro de 2013, mas ainda era necessário desonerar a cadeia produtiva exportadora. Assim, o REINTEGRA foi novamente instituído em 2014.

Demonstrado o arcabouço normativo do REINTEGRA e as razões de sua instituição, cumpre analisar qual a sua natureza jurídica.

  • O REINTEGRA É UM BENEFÍCIO FISCAL?

Inicialmente, para correta compreensão do tema, importante fixar a premissa de que o REINTEGRA não é mera subvenção econômica. Sobre o tema Tércio Sampaio Ferraz Júnior leciona que a concessão do referido crédito não constitui subvenção. isso porque subvenções representariam vantagens financeiras dadas pelo governo para tentar alcançar resultados econômicos desejados, diferentemente do que ocorre com o reembolso real (efetivamente existente) da carga tributária da atividade, implicando sua redução ou exclusão. […] Ou seja, a própria lei referiria que se trata de um ressarcimento, uma devolução de parte do que a empresa já pagou, para desonerar a exportação dos tributos residuais incidentes na cadeia produtiva, tais como as verbas previdenciárias.” [2]

Também não pode ser caracterizado como simples benefício fiscal, pois a compensação decorrente do REINTEGRA não se enquadram “…propriamente, diante de qualquer “vantagem” ou “benefício”. Trata-se, antes, de imunidade objetiva, isto é, não interessa a pessoa do contribuinte, mas apenas o objeto que no caso são as receitas decorrentes de exportação”.[3]

Demonstrado que o REINTEGRA não pode ser caracterizado como incentivo fiscal ou subvenção econômica, Tércio Sampaio Ferraz Júnior conclui, nas palavras do Ministro Edson Fachin, tratar-se de espécie sui generis de repetição de indébito considerando que o valor creditado ou pago ao contribuinte nada mais é do que ressarcimento do ônus fiscal incorrido ao longo da cadeia exportadora constitucionalmente exonerada por regras de imunidades tributárias.

Seguindo essa linha, SCAFF posiciona-se no sentido de reconhecer o REINTEGRA como uma repetição de indébito, a ser devolvido mediante compensação tributária, via PERDCOMP, pois tem origem em uma cobrança indevida de tributos na exportação.[4]

Pelas razões expostas nos parágrafos anteriores, pode-se concluir que o REINTEGRA é uma espécie sui generis de repetição de indébito, existente para concretizar a desoneração das exportações, garantir que não haja perda parcial da eficácia da norma imunizante das exportações de bens e serviços e assegurar o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CF).

  • O AUMENTO DO PERCENTUAL DO REINTEGRA

Considerando que a Lei nº 13.403/2014 reintroduziu o REINTEGRA ordenamento jurídico com o objetivo de sanar falha estrutural do sistema tributário brasileiro, representada pela existência de resíduos tributários na cadeia produtiva exportadora, não restam dúvidas que essa ferramenta é uma extensão da imunidade tributária e um retrato da aplicação do princípio pais do destino

Nesse sentido, o Ministro Edson Fachin, em seu voto proferido no julgamento das ADIs 6040 e 6055, reconheceu que o REINTEGRA opera como instrumento/garantia do princípio do país do destino que albergado no princípio da isonomia (art.150, II) e positivado na Constituição Federal mediante as regras de imunidade tributária, que por sua vez estão a contemplar não somente o método da exoneração, mas, também, o método do crédito/reembolso em consonância com as regras do Sistema Multilateral do Comércio, com destaque para o previsto no GATT (General Agreement Trade Tarifs) e ASMC (Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias) , conforme reconhecido em julgamento em painel instaurado perante o Órgão de Apelação da Organização Mundial do Comércio (OMC). (Dispute Settlement – DS n.472, Apellate Body- World Trade Organization).[5]

Além de tais constatações sobre o REINTEGRA, é importante fixar a premissa de que as imunidades tributárias relativas às exportações devem ser interpretadas de forma teleológica para que lhe sejam concedidas a maior abrangência possível, assegurando a máxima efetividade da legislação infraconstitucional editada para conferir aplicabilidade à imunidade.

Nessa linha de raciocínio, a Ministra Rosa Weber, no julgamento do RE 627815, consignou que nas inúmeras oportunidades em que debatida a questão da hermenêutica constitucional aplicada ao tema das imunidades, adotou a interpretação teleológica do instituto, a emprestar-lhe abrangência maior, com escopo de assegurar à norma supralegal máxima efetividade.[6]

Diante de tais premissas, não restam dúvidas que o REINTEGRA, uma vez criado para devolver resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados, não pode ter seus percentuais livremente alterados pelo Poder Executivo, pois a interpretação da legislação instituidora deve ser de forma teleológica a fim de garantir a imunidade das exportações.

Sobre o tema, José dos Santos Carvalho Filho leciona que o poder regulamentar é a prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação. A prerrogativa, registre-se, é apenas para complementar a lei; não pode, pois, a Administração alterá-la a pretexto de estar regulamentando. Se o fizer, cometerá abuso de poder regulamentar, invadindo a competência do Legislativo.[7]

Nessa linha, o artigo 22 da Lei n.13.043/2014 ao prever ressarcimento “mediante a aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo” como delegação legislativa, considerando a complexidade da avaliação e mensuração dos ônus fiscais de cada regime tributário setorial e fase das diferentes cadeias produtivas exportadoras.[8]

Ocorre que, a discricionariedade do Poder Executivo para redução das alíquotas do REINTEGRA encontra barreiras na própria lei instituidora do programa, cuja finalidade, relembre-se, era devolver o resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados.

Assim, qualquer redução de alíquota deve ser pautada por estudos técnicos que traduzam a real oneração da cadeia produtiva exportadora e demonstrem que a alíquota é compatível com a restituição dos resquícios tributários da cadeia. Diante dessa realidade, qualquer alteração da alíquota que mire objetivo diverso, estará maculada por manifesto desvio de finalidade, afrontando diretamente o art. 37 da Constituição Federal.

No entanto, apesar da vedação à redução aleatória do percentual do REINTEGRA, o Poder Executivo o reduziu sem qualquer estudo técnico por meio dos Decretos n° 8.543/2015, n° 9.148/2017 e n° 9.393/2018. A título de exemplo, importante trazer à baila que a redução realizada no ano de 2018 foi efetuado para fazer frente aos benefícios concedidos aos caminhoneiros, no intuito de acabar com a greve realizada pela categoria.

Uma vez compreendido que a Legislação instituidora do benefício não pode conceder ampla discricionariedade ao Poder Executivo no que se refere à alteração da alíquota do REINTEGRA, é necessário demonstrar qual a interpretação constitucionalmente adequada da Lei n.º 13.043/2014.

Desde logo, importante afastar qualquer interpretação no sentido de que a possibilidade de devolução parcial do benefício, prevista no art. 21 da Lei nº 13.043/2014, confere ao Poder Executivo discricionariedade para fixas as alíquotas em descompasso com os resíduos tributários da cadeia exportadora.

Essa interpretação não encontra amparo na garantia constitucional de desoneração das exportações. A locução “devolver parcial” deve ser interpretada no sentido de que, em decorrência do dinamismo das relações tributárias, nunca será possível a fixação de um índice que efetivamente recomponha todo o custo tributário da cadeia produtiva exportadora.

Diante desse cenário, visando a efetiva aplicação do REINTEGRA e consequente concretização da imunidade das exportações, é necessário garantir às empresas exportadoras o aproveitamento do REINTEGRA em percentual mínimo de 3%.

Além disso, deve ser garantido às empresas exportadoras a realização de requerimento administrativo objetivando a aplicação de percentual adicional caso se comprove, mediante levantamento ou estudo, que o percentual de 3% não garante a integral restituição dos resíduos tributários que oneram a cadeia de produção das empresas exportadoras.

  • CONCLUSÃO

A partir de todos os argumentos expostos nos parágrafos anteriores, pode-se concluir que há forte embasamento jurídico para as empresas exportadoras buscarem junto ao Poder Judiciário o aumento do percentual do REINTEGRA permanentemente para, no mínimo, 3%.

Ainda, é importante atentar que o tema discutido no presente artigo já chegou no Supremo Tribunal Federal (ADIs 6040 e 6055), razão pela qual os contribuintes interessados em aumentar o percentual do REINTEGRA devem se posicionar junto ao Poder Judiciário para evitar que sejam atingidos por eventual modulação de efeitos proposta em caso de julgamento favorável pelo STF.

Por: Wagner Cemin

Alíquota zero: entenda as discussões e conheça as oportunidades envolvendo a Lei do PERSE, o CADASTUR, o Simples Nacional e os CNAEs favorecidos.

  1.  INTRODUÇÃO  

O ano de 2023 começou agitado no campo tributário. Logo nos primeiros dias do ano, foram publicadas normas que aumentaram a carga tributária suportada pelas empresas. Diante dessa realidade, já se observa movimentações dos contribuintes visando o questionamento das novas regulamentações. No centro desse debate, encontra-se a nova regulamentação do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), a qual foi responsável por reduzir drasticamente o número de empresas aptas a usufruir da alíquota zero.

A partir do cenário de incertezas que ronda as empresas pertencentes aos setores de turismo e eventos, esse artigo buscará demonstrar as principais mudanças nesse importantíssimo programa de retomada econômica, elencando os fundamentos que podem levar os contribuintes a buscarem judicialmente a fruição da alíquota zero do IRPJ, CSLL e PIS/COFINS pelo prazo de 60 meses. Aproveitando a oportunidade, também será retratado o panorama atual de algumas antigas discussões envolvendo a Lei do PERSE.

Considerando que a análise detalhada da Lei nº 14.148/21, responsável por criar o PERSE, já foi realizada em outra oportunidade (PERSE: controvérsias envolvendo o programa que reduziu a zero as alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins), o presente artigo irá restringir-se à análise das modificações da discussão ocorridas a partir de agosto de 2022.

Para isso, (2) serão ventilados os principais pontos da IN 2114/2022 RFB editada para regulamentar a fruição do benefício. Em seguida, será demonstrado que a (3) MP 1.147/2022 reduziu o escopo do benefício fiscal. Para entender por completo as novas restrições ao benefício, (4) será indispensável analisar a Portaria nº 11.266 do Ministério da Economia, a qual foi publicada no início do ano de 2023.

Fixadas tais premissas, será possível analisar o panorama das principais discussões envolvendo o PERSE, dentre as quais se destacam as seguintes:

  • Possibilidade de empresas optantes pelo Simples Nacional usufruírem do benefício fiscal (5.1);
  • Necessidade de prévia inscrição no CADASTUR para fazer jus ao benefício (5.2);
  • Desnecessidade das empresas que possuem CNAEs beneficiados exercerem atividades ligadas diretamente ao setor de eventos e aplicação da alíquota zero à totalidade das receitas (5.3);
  • Exclusão de CNAEs que estavam contemplados pelo benefício (5.4).

Ao fim, (6) será possível entender as razões pelas quais os contribuintes possuem sólidos argumentos para questionar judicialmente as restrições ilegais ao benefício da alíquota zero do PERSE. 

  • A REGULAMENTAÇÃO DO PERSE PELA IN Nº 2114/2022 RFB

Com o objetivo de regulamentar a aplicação da alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre as receitas das pessoas jurídicas beneficiadas pelo PERSE, a Receita Federal publicou a IN 2114 no dia 1º de novembro de 2022. Já se imaginava que a Receita Federal iria conceder uma interpretação restritiva à Lei instituidora do benefício fiscal e foi exatamente isso que aconteceu.

Além de estabelecer normas procedimentais para fruição da alíquota zero, a Instrução Normativa restringiu o alcance da “Lei do PERSE”. Dentre as restrições, merecem destaques os seguintes pontos:

  • Criação da exigência de que as receitas abarcadas pela alíquota zero estejam relacionadas às seguintes atividades dos setores de turismo e eventos (art. 2º, I, II, II e IV da IN 2114/2022):

I – realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;

II – hotelaria em geral;

III – administração de salas de exibição cinematográfica; e

IV – prestação de serviços turísticos, conforme disciplinado pelo art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

Segundo a interpretação concedida pela Receita Federal, não basta que as empresas possuam o CNAE listada na Portaria do Ministério da Economia. Também é necessário que a empresa desenvolva algumas das atividades listadas na Instrução Normativa. Essa restrição afeta principalmente as empresas que desenvolvem atividades listas no Anexo I da Portaria do Ministério da Economia, mas que não possuem qualquer relação com os setores de turismo e eventos.

Desde logo, cabe adiantar que essa restrição é ilegal. A redação originária da Lei do PERSE não exige essa vinculação, conforme será detalhado no tópico 5.3.

  • Limitação do benefício fiscal às Receitas decorrentes do CNAEs listados na Portaria do Ministério da Economia.

Pode-se afirmar que está restrição é uma complementação da listada no tópico anterior. Ou seja, além da necessidade de a atividade estar vinculada às atividades anteriormente listadas, a desoneração ficará restrita à receita do CNAE constante na Portaria do Ministério da Economia (art. 2º, parágrafo único da IN 2114/2022).

  • Vedação expressa à fruição da alíquota zero pelas empresas optantes pelo Simples Nacional (art. 4º, parágrafo único da IN 2114/2022).

A partir de uma rápida análise já é possível afirmar que o esvaziamento do benefício fiscal levado à cabo pela Receita Federal é ilegal, contrariando as normas originárias da Lei do PERSE. Para facilitar a compreensão dos pontos controvertidos, cada controvérsia será retratada de forma detalhada em tópico específico.

  • MP 1.147/2022: NOVO MARCO LEGAL DO PERSE

Visando limitar o escopo do benefício fiscal decorrente da adesão ao PERSE, o Poder Executivo editou a MP 1.147/2022. A referida Medida Provisória alterou profundamente a Lei do PERSE. No entanto, ao mesmo tempo que desidratou o benefício fiscal, ratificou várias linhas argumentativas dos contribuintes utilizadas para maximizar o alcance das disposições originais das Lei do PERSE.

A primeira preocupação do Poder Executivo foi alterar a redação do caput do art. 4º da Lei do PERSE. Confira o antes e depois da redação:

Art. 4º da Lei 14.148/2021Art. 4º da Lei 14.148/2021 Modificado pela MP 1.147/2022
Art. 4º – Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei:Art. 4º – Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas em ato do Ministério da Economia:

Uma análise apressada da modificação da redação do caput do art. 4º da Lei do PERSE pode resultar a uma conclusão equivocada de que não houve uma profunda modificação no escopo do benefício. No entanto, a sutil modificação da redação, abriu caminho para uma grande redução dos beneficiários da alíquota.

Ao vincular a possibilidade de fruição do benefício ao art. 2º da Lei do PERSE, o legislador acabou por permitir que qualquer empresa que possuísse o CNAE listado na Portaria do Ministério da Economia pudesse usufruir do benefício fiscal da alíquota zero. Ou seja, seguindo uma interpretação literal da redação originária da Lei do PERSE e da Portaria do Ministério da Economia, não havia necessidade da atividade desenvolvida pela pessoa jurídica guardar qualquer relação com os setores de evento e turismo.

Percebendo essa realidade, o Poder Executivo optou por alterar a redação do caput do art. 4º da Lei do PERSE. Com a nova redação, o benefício fiscal da alíquota zero favorece apenas as pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos. Não há mais vinculação ao art. 2º da Lei do PERSE, por meio da nova redação, estabeleceu-se uma desvinculação do benefício fiscal da alíquota zero das demais benesses presentes na Lei do PERSE.

Outra importante modificação decorrente da MP 1.147/2022 consiste na introdução do § 1º ao art. 4º da Lei do PERSE. O referido parágrafo dispõe que a alíquota zero será aplicada somente às receitas e aos resultados das atividades do setor de eventos.

Por fim, outra alteração relevante decorrente da MP 1.147/2022 consiste na vedação à manutenção do crédito de PIS/COFINS vinculados às receitas decorrentes das atividades do setor de eventos. A redação originária era silente quando a essa questão, razão pela qual se aplicava a regra geral que permitia a manutenção dos créditos vinculados às operações tributadas a alíquota zero (art. 17 da Lei nº 11.033/2004)[1].

É importante lembrar que o Poder Executivo evitou uma série de discussões sobre o tema ao prever que a vedação ao creditamento deveria respeitar a regra da anterioridade nonagesimal.

Expostos os principais pontos da MP 1.147/2022, passa-se à análise da Portaria nº 11.266 do Ministério da Economia editada para cumprir o disposto na nova redação do caput do art. 4º da Lei do PERSE.

  • PORTARIA Nº 11.266 DO ME – EXCLUSÃO DE 50 CNAES

Para cumprir o disposto no art. 4º da Lei do PERSE, o Ministério da Economia editou a Portaria 11.266, a qual foi publicada no dia 02 de janeiro de 2023. Por meio do referido ato normativo, foram estabelecidos os novos CNAEs que fazem jus ao benefício fiscal da alíquota zero no âmbito do PERSE.

Seguindo a linha da Portaria ME 7.163, a nova regulamentação do PERSE manteve a exigência de as empresas já estarem em atividade na data da publicação do art. 4º da Lei do PERSE para usufruírem do benefício fiscal relativo à alíquota zero. Ou seja, para fazer jus ao benefício, a pessoa jurídica já deveria estar em atividade em 18 de março de 2022.

Além disso, foi mantida a divisão em dois subgrupos de CNAEs. O primeiro grupo é relativo às atividades que não necessitam de inscrição no CADASTUR para fruição do benefício fiscal. Esses são os CNAEs integrantes no ANEXO I da Portaria:

CNAEDescrição
5510-8/01HOTÉIS
5510-8/02APART HOTÉIS
5590-6/01ALBERGUES, EXCETO ASSISTENCIAIS
5590-6/02CAMPINGS
5590-6/03PENSÕES (ALOJAMENTO)
5590-6/99OUTROS ALOJAMENTOS NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE
5911-1/02PRODUTORA DE FILMES PARA PUBLICIDADE
5914-6/00ATIVIDADES DE EXIBIÇÃO CINEMATOGRÁFICA
7319-0/01CRIAÇÃO ESTANDES PARA FEIRAS E EXPOSIÇÕES
7420-0/01ATIVIDADES DE PRODUÇÃO DE FOTOGRAFIAS, EXCETO AÉREA E SUBMARINA
7420-0/04FILMAGEM DE FESTAS E EVENTOS
7490-1/05AGENCIAMENTO DE PROFISSIONAIS PARA ATIVIDADES ESPORTIVAS, CULTURAIS E ARTÍSTICAS
7721-7/00ALUGUEL DE EQUIPAMENTOS RECREATIVOS E ESPORTIVO
7739-0/03ALUGUEL DE PALCOS, COBERTURAS E OUTRAS ESTRUTURAS DE USO TEMPORÁRIO, EXCETO ANDAIMES
8230-0/01SERVIÇOS DE ORGANIZAÇÃO DE FEIRAS, CONGRESSOS, EXPOSIÇÕES E FESTAS
8230-0/02CASAS DE FESTAS E EVENTOS
9001-9/01PRODUÇÃO TEATRAL
9001-9/02PRODUÇÃO MUSICAL
9001-9/03PRODUÇÃO DE ESPETÁCULOS DE DANÇA
9001-9/04PRODUÇÃO DE ESPETÁCULOS CIRCENSES, DE MARIONETES E SIMILARES
9001-9/06ATIVIDADES DE SONORIZAÇÃO E DE ILUMINAÇÃO
9001-9/99ARTES CÊNICAS, ESPETÁCULOS E ATIVIDADES COMPLEMENTARES NÃO ESPECIFICADAS ANTERIORMENTE
9003-5/00GESTÃO DE ESPAÇOS PARA ARTES CÊNICAS, ESPETÁCULOS E OUTRAS ATIVIDADES ARTÍSTICAS
9319-1/01PRODUÇÃO E PROMOÇÃO DE EVENTOS ESPORTIVOS

O outro grupo de empresas beneficiadas deve possuir inscrição no  Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (CADASTUR), a qual deve ter sido efetuada até o dia 18 de março de 2022. Os CNAEs constantes no ANEXO II são os seguintes:

CNAEDescrição
4923-0/02SERVIÇO DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS – LOCAÇÃO DE AUTOMÓVEIS COM MOTORISTA
4929-9/01TRANSPORTE RODOVIÁRIO COLETIVO DE PASSAGEIROS, SOB REGIME DE FRETAMENTO, MUNICIPAL
4929-9/02TRANSPORTE RODOVIÁRIO COLETIVO DE PASSAGEIROS, SOB REGIME DE FRETAMENTO, INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL E INTERNACIONAL
4929-9/03ORGANIZAÇÃO DE EXCURSÕES EM VEÍCULOS RODOVIÁRIOS PRÓPRIOS, MUNICIPAL
4929-9/04ORGANIZAÇÃO DE EXCURSÕES EM VEÍCULOS RODOVIÁRIOS PRÓPRIOS, INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL E INTERNACIONAL
5011-4/02TRANSPORTE MARÍTIMO DE CABOTAGEM – PASSAGEIROS
5012-2/02TRANSPORTE MARÍTIMO DE LONGO CURSO – PASSAGEIROS
5099-8/01TRANSPORTE AQUAVIÁRIO PARA PASSEIOS TURÍSTICOS
5611-2/01RESTAURANTES E SIMILARES
7911-2/00AGÊNCIAS DE VIAGEM
7912-1/00OPERADORES TURÍSTICOS
9102-3/01ATIVIDADES DE MUSEUS E DE EXPLORAÇÃO DE LUGARES E PRÉDIOS HISTÓRICOS E ATRAÇÕES SIMILARES
9321-2/00PARQUES DE DIVERSÃO E PARQUES TEMÁTICOS
9493-6/00ATIVIDADES DE ORGANIZAÇÕES ASSOCIATIVAS LIGADAS À CULTURA E À ARTE

Traçado o atual panorama normativo do benefício fiscal da alíquota zero no âmbito do PERSE, é possível analisar as principais controvérsias envolvendo a sua regulamentação.

  • CONTROVÉRSIAS ENVOLVENDO A REGULAMENTAÇÃO DO PERSE
    • O PERSE E O SIMPLES NACIONAL

Conforme referido no tópico 2, a IN Nº 2114/2022 RFB vedou expressamente a extensão da alíquota zero às empresas optante pelo Simples Nacional. Já era esperado que a Receita Federal interpretaria o benefício fiscal de forma desfavorável às micro e pequenas empresas.

Ocorre que, conforme já defendido no artigo anterior sobre o tema, o art. 146, inciso III, “d” da Constituição Federal determina que seja concedido tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte. Seguindo essa linha, não há dúvidas que, ao se realizar uma interpretação teleológica da lei instituidora do PERSE, pode-se concluir que o favor fiscal também deve beneficiar todas as pessoas jurídicas integrantes dos setores elencados na lei e na Portaria, independentemente do regime de tributação escolhido.

Com base em tal argumento, ao longo dos últimos meses, inúmeras empresas optantes pelo Simples Nacional bateram na porta do poder judiciário para buscar usufruir da alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Dentre os processos ajuizados, já se tem notícias de decisões favoráveis aos contribuintes.

A título de exemplo, é possível citar a decisão liminar proferida no processo 1009912-75.2022.4.06.3800. Na oportunidade, permitiu-se que as empresas optantes pelo regime do Simples Nacional também possam usufruir dos benefícios fiscais previstos no artigo 4º da Lei nº 14.148/2021.

Diante desse cenário, é possível concluir que as empresas optantes pelo Simples Nacional possuem argumentos para buscar judicialmente a possibilidade de usufruir desse importante benefício fiscal.  

  • NECESSIDADE DE INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR

Esse tema também já foi abordado no artigo anterior sobre o PERSE. Na oportunidade, defendeu-se que ato infralegal não pode contrair a própria lei que pretende regulamentar. Ou seja, a Portaria ME 11.266 não poderia ter instituído requisito temporal (necessidade de cadastro no CADASTUR até dia 18/03/2022) não previsto originariamente na lei 14.148/21. Cabe destacar que a IN Nº 2114/2022 RFB também trouxe esse requisito temporal de inscrição no CADASTUR.

Apesar dos sólidos fundamentos jurídicos para defender a ilegalidade da exigência temporal, o atual panorama da discussão é desfavorável aos contribuintes.

Mesmo diante desse viés negativo, no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, há decisões que reconhecem a ilegalidade da limitação temporal da inscrição no CADASTUR. Nessa linha, no processo nº 0806070-81.2022.4.05.8300, o contribuinte obteve sentença favorável, por meio da qual o Poder Judiciário reconheceu que atos regulamentares não podem inovar a ordem jurídica, estabelecendo condições ou limitações que a lei não estabelece.

No mesmo sentido, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em decisão proferida no Agravo de Instrumento nº 5022613-35.2022.4.03.0000 pelo Desembargador Nery Júnior, foi reconhecido que não pode, ante a ausência de respaldo legal, a situação cadastral regular no CADASTUR servir como condição para que os restaurantes, cafeterias, bares e similares, que exerçam atividade econômica de prestação de serviços turísticos, possam imediatamente se valer dos benefícios da alíquota zero dos tributos previstos no art. 4.º, da Lei n. 14.148/2021.

A partir de tal conjuntura, é possível afirmar que, por ser extremamente recente, há grandes possibilidades de reversão do atual panorama da discussão. Por tal motivo, recomenda-se que os contribuintes que tenham o CNAE listado no Anexo II das Portarias ME nº 7.163 e nº 11.266 considerem a possibilidade de discutir judicialmente a ilegal requisito de inscrição temporal no CADASTUR.

  • EMPRESAS BENEFICIADAS E VINCULAÇÃO DA ALÍQUOTA ZERO À TOTALIDADE DAS RECEITAS

Sem dúvida, um dos pontos mais controversos envolvendo o benefício fiscal ora analisado está na definição da necessidade de as empresas comprovarem que exercem atividades ligadas ao setor de eventos. Em síntese, é necessário analisar se basta que a empresa desenvolva umas das atividades listadas nas Portarias para usufruir da alíquota zero.

Antes de responder tal questionamento, é necessário relembrar que benefícios fiscais devem ser interpretados literalmente, nos termos do art. 111 do CTN. Sobre o tema, Hugo de Brito Machado é assertivo ao lecionar que quem interpreta literalmente por certo não amplia o alcance do texto, mas com certeza também não o restringe.[2]

Isto posto, é preciso analisar qual seria o resultado de uma interpretação literal da redação originária do art. 4º da Lei nº 14.148/21. Para isso, importante analisar o que dispõe o referido dispositivo:

Art. 4º da Lei 14.148/21: Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei:    

I – Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);

II – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e

IV – Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).”

A partir da leitura do art. 4º da Lei nº 14.148/21, verifica-se a necessidade de destaque de dois pontos. O primeiro é relativo à análise do que significa “resultado auferido” e o segundo consiste em identificar quais são as “pessoas jurídicas de que trata o art. 2º da Lei 14.148/21”. Tais informações servirão de subsídios para a interpretação literal do dispositivo legal que concedeu o benefício fiscal que está sendo utilizado pelas consulentes.

Nesse sentido, no que se refere ao primeiro ponto, a expressão “resultado auferido”, não há maiores controvérsias quanto ao seu significado. Literalmente, tal expressão deve ser interpretada como o resultado líquido do exercício para fins de redução a zero das alíquotas do IRPJ e da CSLL. Por outro lado, no que se refere ao PIS e à COFINS, essa expressão deve ser interpretada como receita/faturamento. Inexiste qualquer palavra que faz o papel de limitar a extensão do benefício às receitas vinculadas às atividades listadas nas Portaria do Ministério da Economia.

Além disso, é importante pontuar que, na proposição originária da “Lei do PERSE”, o artigo responsável por conceder o benefício fiscal ora analisado possuía disposição expressa no sentido de que a alíquota zero ficaria restrita às receitas decorrentes das atividades de eventos. Assim, como tal restrição foi retirada durante o processo legislativo, é evidente que o legislador buscou abranger todas as receitas pela alíquota zero.

Seguindo o caminho da interpretação literal do art. 4º da Lei nº 14.148/21, é necessário identificar quem são as pessoas jurídicas de que trata o art. 2º, ou seja, quem são as pessoas jurídicas beneficiadas pelo PERSE. Para isso, importante transcrever o art. 2º da Lei nº 14.148/21 referido dispositivo:

Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:  I – realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; II – hotelaria em geral; III – administração de salas de exibição cinematográfica; e IV – prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.

É importante buscar o significado do § 2º do artigo ora analisado. A interpretação literal do referido dispositivo leva à conclusão de que o Poder Legislativo delegou ao Poder Executivo (Ministério da Economia) a definição de quais pessoas jurídicas pertencem ao setor de eventos.

Como se observa, restou expressamente consignado que ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos. Ou seja, apesar do § 1º elencar as atividades que pertenceriam ao setor de eventos, a redação do § 2º não deixa margens para dúvidas que a definição final das atividades que se enquadram no setor de eventos será feita por ato do Ministério da Economia.

O art. 2º da Lei nº 14.148/21 foi regulamentado pela Portaria ME Nº 7.163, de 21 de junho de 2021, a qual possui o seguinte teor:

Art. 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II.

§ 1º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – Perse.

§ 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

A redação da referida Portaria não deixa margem para qualquer dúvida. Restou definido que as pessoas jurídicas que desenvolviam as atividades econômicas relacionadas em seus Anexos integram o setor de Eventos. 

Não se constata qualquer outro requisito para que uma pessoa jurídica integre o setor de eventos e se enquadre no PERSE. Não há exigência que as pessoas jurídicas desenvolvam a atividade de forma principal.

A literalidade da Portaria ME Nº 7.163/2021 leva à conclusão de que as empresas podem desenvolver a atividade econômica considerada pertencente ao setor de eventos apenas de forma secundária. Esse ponto deve ser destacado. A regulamentação realizada pelo Ministério da Economia não impôs o requisito do CNAE principal constar em seus anexos.

Além disso, é importante destacar que o benefício fiscal de redução à zero das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e COFISN está inserido dentro de um programa mais abrangente de retomada econômica. A Lei nº 14.148/21 e traz uma série de benesses concedidas às empresas, dentre as quais, além da alíquota zero, destaca-se a possibilidade de quitação do débito mediante a aplicação de desconto de até 70% (setenta por cento) sobre o valor total da dívida e com prazo máximo para sua quitação de até 145 (cento e quarenta e cinco) meses.

Feitas tais considerações, deve ser destacado que, até a edição da MP nº 1.147/2022, não havia qualquer categorização das atividades econômicas para fins de aproveitamento de algum benefício específico concedido no âmbito do PERSE. Em outras palavras, a Lei nº 14.148/21 não criou requisitos específicos para que, por exemplo, as pessoas jurídicas pudessem usufruir da redução a zero das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Tal raciocínio fica ainda mais claro quando analisada uma modificação específica da MP nº 1.147/2022. Trata-se do § 4º adicionado ao art. 4º da Lei nº 14.148/21, o qual possui a seguinte redação:

Art. 4º  Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas em ato do Ministério da Economia:   (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.147, de 2022)

(…)

§ 4º  Até que entre em vigor o ato a que se refere o caput, a fruição do benefício fiscal de que trata este artigo deverá basear-se no ato que define os códigos CNAE previsto no § 2º do art. 2º. (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.147, de 2022)

A simples leitura do dispositivo supracitado ratifica a tese desenvolvida nos parágrafos anteriores, pois o próprio Poder Executivo legitimou a interpretação do benefício fiscal defendida pela Impetrante. O § 4º dispõe que, até a entrada em vigor da nova regulamentação, a fruição da alíquota zero levará em consideração ato que define os códigos CNAE previsto no § 2º do art. 2º, ou seja, Portaria ME Nº 7.163/2021. Ou seja, até a edição da nova Portaria do Ministério da Economia, os requisitos para fruição da alíquota zero eram os mesmos exigidos para adesão à transação no âmbito do PERSE.

Ocorre que, como já era esperado, a interpretação da Receita Federal à antiga redação do art. 4º da Lei nº 14.148/21, vai de encontro ao que se defendeu nos parágrafos anteriores. Para esclarecer a sua intepretação sobre o benefício fiscal em questão, a Receita Federal editou a Instrução Normativa nº 2114/2022. Para o deslinde do presente processo, cabe destacar o que dispõe o art. 2º da referida norma:

Art. 2º O benefício fiscal a que se refere o art. 1º consiste na aplicação da alíquota de 0% (zero por cento) sobre as receitas e os resultados das atividades econômicas de que tratam os Anexos I e II da Portaria ME nº 7.163, de 21 de junho de 2021, desde que eles estejam relacionados à:

I – realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;

II – hotelaria em geral;

III – administração de salas de exibição cinematográfica; e

IV – prestação de serviços turísticos, conforme disciplinado pelo art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.

Parágrafo único. O benefício fiscal não se aplica às receitas e aos resultados oriundos de atividades econômicas não relacionadas no caput ou que sejam classificadas como receitas financeiras ou receitas e resultados não operacionais.

Segundo a interpretação concedida pela Receita Federal, não basta que as empresas possuam o CNAE listada na Portaria do Ministério da Economia. Também é necessário que a empresa desenvolva algumas das atividades listadas nos incisos do art. 2º da Instrução Normativa nº 2114/2022.

Além da necessidade de vinculação às atividades listadas nos incisos do art. 2º, a desoneração ficará restrita à receita do CNAE constante na Portaria do Ministério da Economia, conforme previsão expressa no art. 2º, parágrafo único da IN 2114/2022.

A partir do que se defendeu até aqui, é de clareza meridiana que é ilegal qualquer regulamentação que não garanta o benefício da alíquota zero a todas as receitas das empresas que possuem CNAEs, ainda que secundários, listados no ANEXO I da Portaria ME nº 7.163/2021 ao menos até a entrada em vigor da MP nº 1.147/2022 responsável por alterar a redação originária do art. 4º da Lei nº 14.148/2021.

Com base no exposto nesse tópico, é possível concluir que a interpretação da Receita Federal não é adequada, razão pela qual as empresas afetadas podem recorrer ao poder judiciário para afastá-la.

  • EXCLUSÃO DE CNAES QUE ESTAVAM CONTEMPLADOS PELO BENEFÍCIO 

Conforme já referido, outro ponto relevante alterado pela nova regulamentação do PERSE consiste na exclusão de diversas atividades que anteriormente estavam contempladas pelo benefício fiscal da alíquota zero. No artigo anterior, foram listadas todas os CNAEs contemplados originariamente pela alíquota zero.

O primeiro ponto de discussão relativo à exclusão dos CNAEs reside na impossibilidade de revogação de benefício fiscal oneroso concedido por prazo determinado. Além disso, também é possível defender a aplicação da regra da anterioridade para vigência das alterações decorrentes da Portaria ME nº 11.266.

Nesse sentido, em atenção ao disposto no art. 178 do CTN e em respeito ao princípio da segurança jurídica, benefícios ficais onerosos instituídos por prazo determinado não podem ser livremente revogados. Diante dessa realidade, é necessário analisar se o benefício fiscal da alíquota zero no âmbito do PERSE preenche essas condições,

No que se refere à primeira condição (benefício fiscal concedido por prazo certo), não há qualquer controvérsia quanto ao fato de que o art. 4º da Lei nº 14.148/2021 estabeleceu que a redução à zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS duraria por 60 meses.

Já em relação à onerosidade, segunda condição elencada pelo art. 178 do CTN, há elementos para defender sua presença. Apesar de não contar com nenhuma contrapartida expressa para sua fruição, o benefício fiscal da alíquota zero no âmbito do PERSE pode ter levado as empresas originariamente beneficiadas a realizarem investimentos com a perspectiva de que tal benesse fiscal seria mantida pela prazo de 60 meses, fato que pode ser utilizado para defender a existência de onerosidade  do benefício fiscal em análise.

Além disso, é possível defender que a exclusão dos CNAEs da lista de atividades contempladas pelo benefício fiscal da alíquota zero deve observar a regra da anterioridade.

No que se refere à regra da anterioridade, seja a de exercício ou nonagesimal, é necessário perquirir qual o objetivo da norma constitucional que concedeu proteção aos contribuintes em relação às modificações abruptas na carga tributária. A anterioridade, portanto, faz com que as normas que majorem tributos, inclusive de forma indireta, estejam condicionadas à observância de determinado prazo que confira segurança e previsibilidade aos contribuintes.

Em relação ao benefício da alíquota zero das contribuições sociais (CSLL, PIS e COFINS), o art. 195, § 6º, da Constituição Federal prevê a aplicação da regra da anterioridade nonagesimal. Por outro lado, em relação ao IRPJ, o art. 150, III, “b” da Constituição Federal, prevê a aplicação da regra da anterioridade de exercício.

Com base em tais premissas, não restam dúvidas que a exclusão de diversos CNAEs da lista de atividades beneficiadas pela alíquota zero no âmbito do PERSE deve respeitar a regra da anterioridade nonagesimal (CSLL, PIS e COFINS) e de exercício (IRPJ).

Ou seja, há argumentos para as empresas excluídas do PERSE buscarem judicialmente a manutenção da alíquota zero do PIS, COFINS e CSLL pelo prazo de noventa dias contados da publicação (2 de janeiro de 2023) Portaria ME nº 11.266. Por outro lado, em relação ao IRPJ, é possível defender o aproveitamento da alíquota zero durante todo o ano de 2023.

  • CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base em todos os argumentos expostos nos parágrafos anteriores, pode-se concluir que que as novas regulamentações do benefício fiscal da alíquota zero no âmbito do PERSE foram extremamente prejudiciais aos contribuintes. Esse importantíssimo benefício fiscal teve sua abrangência reduzida, seja em relação à exclusão de setores beneficiados ou em decorrência da vinculação da alíquota zero às receitas decorrentes do setor de eventos.

Além disso, as antigas discussões sobre o requisito temporal de inscrição no CADASTUR e possibilidade de extensão do benefício às empresas optantes pelo Simples Nacional ainda não foram definidas pelo Poder Judiciário.

Diante desse contexto, é importante que as empresas conheçam as discussões travadas no âmbito do PERSE para estarem atentas às possíveis oportunidades de afastar, por meio do Poder Judiciário, as limitações à fruição do benefício fiscal da alíquota zero.


Por: Wagner Cemin

Prejuízo fiscal na transação: porque está melhor negociar com a Receita

A Lei nº 13.988/20, conhecida como a Lei da Transação Tributária, alterada em junho deste ano, por meio da Lei 14.375/22, trouxe importante avanço para a formação do plano de regularização, não apenas no tocante à majoração do percentual de desconto e dilação do prazo, mas pelo fato de prever a utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL até o limite de 70% do saldo remanescente após a incidência dos descontos.

A legislação inclusive permitiu o uso de créditos de prejuízo fiscal de titularidade do responsável tributário ou corresponsável pelo débito, de pessoa jurídica controladora ou controlada, de forma direta ou indireta, ou de sociedades que sejam controladas direta ou indiretamente por uma mesma pessoa jurídica, apurados e declarados à Secretaria Especial da Receita Federal, independentemente do ramo de atividade, no período previsto pela legislação tributária.

No entanto, restou evidenciada, com a limitação do emprego do prejuízo fiscal a 70% do saldo remanescente, que o legislador deseja que o contribuinte tenha algum desembolso financeiro, não permitindo a liquidação do passivo apenas com os benefícios concedidos.

Importante lembrar que a administração tributária federal sempre reconheceu a possibilidade do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa isentar o pagamento do IRPJ/CSLL, reduzir o IRPJ/CSLL a ser pago em períodos subsequentes onde haja existência de lucro tributável e constituir direito de crédito quanto aos adiantamentos em caráter de estimativa que tiverem sido realizados pela empresa. E, por diversas oportunidades, a União admitiu a utilização de tais créditos como forma de abatimento de débitos federais em programas especiais de parcelamento, como no Refis da Crise (Lei 11.941/09), Prorelit (Lei 13.202/15), Pert (Lei 13.496/17), entre outros.

Por isso, acertada a alteração da Lei da Transação para viabilizar o emprego deste meio de pagamento historicamente reconhecido pela política tributária como apto a equalizar o passivo tributário.

O legislador, ao inserir o §1º-A no artigo 11 na Lei 13.988/20, deixou a critério exclusivo da Receita e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) adotar o uso dos créditos de prejuízo fiscal em casos excepcionais para a melhor e efetiva composição do plano de regularização.

A Receita regulamentou a matéria por meio das Portarias 208/22 e 247/22, permitindo o uso dos créditos de prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL para todas as modalidades de transação, seja por proposta da Receita, de forma individual ou por adesão, ou por iniciativa do devedor, sem quaisquer limitações de prazo para a sua utilização [1].

Além disso, a Receita autorizou que todos os contribuintes com débitos no contencioso administrativo utilizem este importante ativo de suas empesas, independentemente do grau de recuperabilidade deste crédito. Ou seja, mesmo os créditos com alta ou média perspectiva de recuperação poderão fazer uso de prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa.

Já a PGFN, ao regulamentar as disposições da Lei 14.375/22 por meio da Portaria PGFN/ME 6.757/22, previu tratamento diverso e muito mais restritivo para a utilização do benefício.

Ao contrário da Receita, a PGFN permitirá o aproveitamento apenas nas transações de créditos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação, e de forma subsidiária, isto é, se inexistentes ou esgotados outros créditos líquidos e certos em desfavor da União.

A Portaria 6.757/22 também vedou o uso do prejuízo fiscal nas transações por adesão e na individual simplificada, violando, a meu ver, o princípio da isonomia, já que excluiu diversos contribuintes em situação idêntica, que necessitam aproveitar do mesmo benefício para equalização do seu passivo fiscal.

Tal vedação foi provisoriamente mitigada, pelo exíguo prazo de 60 dias, pela Portaria PGFN 8.798/22, que instituiu o Programa de Quitação Antecipada de Transações e Inscrições da Dívida Ativa da União (QuitaPGFN). Ela permite a utilização do benefício para algumas modalidades de transação [2], desde que para amortização de créditos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação e a adesão ocorra até 30/12/22. Entretanto, impõe condição extremamente onerosa, a saber: a quitação em espécie de, no mínimo, 30% do saldo transacionado, em até seis parcelas.

Percebe-se que a regulamentação da matéria pela Receita está muito mais alinhada à autorização legal dada aos agentes públicos, do que a estipulada pela PGFN, que expressamente atribui caráter excepcional e condiciona o aceite à demonstração de imprescindibilidade do prejuízo fiscal para a composição do plano de regularização ou à quitação à vista de parte do saldo transacionado. Referida regulamentação tem gerado preocupação: será que outros critérios, além das restrições já impostas na regulamentação da PGFN, poderão ser usados para impedir ou dificultar a utilização deste meio de extinção do crédito no campo da transação tributária?

O simples fato de o contribuinte ter prejuízo fiscal acumulado, somado à classificação do crédito como de difícil recuperação ou irrecuperável, parecem, por si só, serem elementos suficientes para demonstrar as dificuldades financeiras do devedor, tornando imprescindível a sua utilização para equalização do passivo fiscal, mantendo o plano de pagamento no prazo máximo concedido.

Priorizar a venda de bens da empresa, por exemplo, antes da utilização dos créditos de prejuízo fiscal, mostra-se desarrazoado e desproporcional e viola o princípio da menor onerosidade da execução (artigo 805 do CPC [3]). Este princípio representa a aplicação da proporcionalidade no processo de execução, na medida em que busca garantir a efetividade da execução e a preservação do patrimônio do devedor.

Ora, se no âmbito do contencioso judicial o julgador deve observar que a excussão dos bens se faça de maneira menos gravosa ao devedor; no âmbito da transação, à luz dos princípios da consensualidade e da resolutividade, a PGFN deve observá-lo com ainda mais rigor. Espera-se equilíbrio entre a garantia da efetividade da cobrança e a preservação do patrimônio do executado, permitindo a utilização de todos os benefícios autorizados pelo legislador, inclusive do prejuízo fiscal, por ser uma forma há muito permitida pela política tributária para amortização dos respectivos créditos.

Não nos esqueçamos que a transação é um meio de resolução de litígios tributários que traz consigo, muito além do viés arrecadatório, o correto tratamento dos contribuintes, sejam aqueles que já não possuem capacidade de pagamento, sejam aqueles que foram autuados, não raro, pela complexidade da legislação que permitia interpretação razoável em sentido contrário àquele reputado como adequado pelo fisco, justificando, por isso, a aceitação do prejuízo fiscal para compor a negociação.

Assim, interpretar de maneira diversa, limitando a cumulação de benefícios previstos no artigo 11 da Lei 13.988/20, ou restringindo a utilização de prejuízo fiscal/base de cálculo negativa de CSLL, é ir de encontro aos princípios e objetivos do instituto da transação, bem referenciados nos artigos 2º e 3º da Portaria PGFN/ME 6.757/22.

[1] A transação por adesão é a modalidade que o devedor apenas aceita as condições fixadas no edital. A efetiva negociação com o Fisco ocorre apenas na transação por proposta individual — que abarca débitos superiores a R$ 10 milhões — e na individual simplificada — que abrange débitos de R$ 1 milhão a R$ 10 milhões. O artigo 40 da Portaria 208/22 também dispõe de outras hipóteses de transação individual.

[2] O artigo 5º, incisos I a V da Portaria PGFN 8.798/22 dispõe que transações celebradas por adesão conforme Editais nº 01/19 e 02/21; as firmadas na modalidade excepcional; as do PERSE e as individuais poderão aderir ao QuitaPGFN.

[3] “Artigo 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado”.

Fonte: Consultor Jurídico por Jussandra Hickmann Andraschko

Transação Tributária – A Possibilidade de dialogar com o Fisco Federal

Apesar da inexistência de programas especiais de parcelamento de tributos federais, como o aguardado “Super Refis” ou a reabertura do PERT, o contribuinte dispõe de uma valiosa ferramenta de autocomposição de litígios em matéria tributária, melhor inclusive que os antigos meios de regularização de seu passivo: a Transação Individual. Apesar de vantajosas, as opções de Transação por Adesão, disponibilizadas no âmbito da Receita Federal do Brasil e da Procuradoria da Fazenda Nacional, vinculam o contribuinte a condições previamente impostas pelos órgãos, sem possibilidade de discussão do método de pagamento, descontos etc.

Por sua vez, a Transação Individual, prevista na Portaria PGFN Nº 6.757 de 29 de julho de 2022, é uma modalidade na qual o contribuinte consegue dialogar e negociar diretamente com a Procuradoria da Fazenda Nacional, débitos inscritos em dívida ativa, com efetiva composição bilateral e concessões mútuas. Recentemente, referido instrumento de negociação, foi oportunizado também no âmbito da Receita Federal, por meio da Portaria RFB Nº 208, de 11 de agosto de 2022, para contribuintes que possuam objeto de contencioso administrativo fiscal.

Este mecanismo confere tratamento especial às empresas com dificuldades para regularização dos seus débitos, mediante a elaboração de um plano de recuperação fiscal que atenda as possibilidades das companhias.

Através do instituto da Transação Individual é possível que o devedor:

  1. Apresente um cronograma de pagamento que se adeque às necessidades da empresa, amortizando seus débitos de maneira escalonada, com reforços anuais;
  2. Obtenha descontos apropriados à redução da sua capacidade de pagamento, inclusive melhorando descontos anteriores obtidos em parcelamentos ou outras transações;
  3. Utilize crédito de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa, até mesmo de empresa coligada ou controlada, para equalização do plano de regularização;
  4. Utilize créditos líquidos e certos em desfavor da União, reconhecidos em decisão transitada em julgado, ou de precatórios federais próprios ou de terceiros, para fins de amortização ou liquidar saldo devedor transacionado;
  5. Obtenha flexibilização das regras para aceitação, avaliação, substituição e liberação de garantias, bem como das regras para constrição ou alienação de bens.

Os benefícios da transação tributária, seja ela por adesão ou proposta individual, demonstram a importância deste meio de resolução de conflitos em matéria tributária, que traz consigo, muito além do viés arrecadatório, mas de correto tratamento aos contribuintes, sejam aqueles que já não possuem capacidade de pagamento, sejam aqueles que foram autuados, não raro, pela complexidade da legislação que permitia interpretação razoável em sentido contrário àquele reputado como adequado pelo fisco.

O conhecimento técnico aliado à experiência, análise pormenorizada dos débitos e possibilidades de nossos clientes, tem feito com que os auxiliemos na solução de seus conflitos com o Fisco Federal.

Esta importante ferramenta vem sendo realizada por nossa equipe deste o início da vigência da transação. Firmamos umas das primeiras transações tributárias individuais com a PGFN da 4ª Região, representando os interesses de empresa do setor de embalagens, obtendo desconto superior a R$ 15 milhões.

Atualmente, estamos mediando diversos acordos de Transação com a Fazenda Nacional, e evoluindo positivamente em todas as tratativas, buscando o melhor resultado para regularização do passivo fiscal de nossos clientes.

Por Jussandra Hickmann Andraschko

PERSE: Saiba como sua empresa pode deixar de pagar tributos por 60 meses

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A Lei nº 14.148/2021 estabeleceu ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19. Nessa linha, foi instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE).

Dentre os vários incentivos criados no âmbito do PERSE, o que mais se destaca é a redução a zero da alíquota pelo prazo de 60 meses do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do PIS/COFINS incidentes sobre o resultado auferido por empresas pertencentes a diversos setores. 

No entanto, considerando que no Brasil até o passado é incerto, esse benefício fiscal já é objeto de grandes controvérsias sobre sua aplicabilidade. Diante desse cenário, é importante que as empresas conheçam tais discussões e saibam o caminho a percorrer para fazer jus a essa redução significativa da carga tributária.

Para auxiliar o contribuinte no entendimento desse tema, pretende-se responder algumas perguntas recorrentes sobre o PERSE. Nesse sentido, é importante começar do início.

O que é o PERSE?

O PERSE é um programa de recuperação econômica setorial desenvolvido para fazer frente aos efeitos decorrentes das medidas de isolamento realizadas para enfretamento da pandemia de Covid-19.

Seguindo essa linha, o PERSE autorizou o Poder Executivo a disponibilizar modalidades de renegociação de dívidas tributárias e não tributárias, incluídas aquelas para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). No âmbito do PERSE, os contribuintes em dívida com o Fisco Federal foram agraciados com a possibilidade de quitação do débito mediante a aplicação de desconto de até 70% (setenta por cento) sobre o valor total da dívida e com prazo máximo para sua quitação de até 145 (cento e quarenta e cinco) meses.

Além disso, as pessoas jurídicas beneficiárias do PERSE que se enquadrem nos critérios do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (PRONAMPE) serão contempladas em subprograma específico.

Na mesma linha, foram reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas contempladas pelo PERSE:  

  • Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (CONTRIBUIÇÃO PIS/PASEP);
  • Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS);
  • Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e
  • Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ).

Ou seja, as empresas contempladas pelo programa não irão pagar IRPJ, CSLL, PIS e COFINS pelos próximos 5 anos.  Tendo em vista que o principal benefício consiste justamente na redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, a partir de agora a análise será focada nas nuances que permeiam esse benefício.

Quando entra em vigor o PERSE?

Em relação à redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, o PERSE entrou em vigor na data de 18 de março de 2022. Apesar da Lei instituidora do PERSE ter sido publicada ainda no ano de 2021, a parte relativa à redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS inicialmente havia sido vetada pelo Presidente da República, sendo que o veto apenas foi derrubado em março de 2022.

 Quem pode entrar no PERSE?

Essa é a grande questão controvertida em relação à possibilidade de aproveitamento da alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS pelos próximos 60 meses. Conforme expressamente disposto na Lei instituidora do PERSE, a definição dos setores contemplados pelo PERSE ficou sob a responsabilidade do Ministério da Economia. Nesse sentido, foi editada a Portaria ME Nº 7.163 por meio da qual foram identificados os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram no PERSE.

A definição dos setores que podem usufruir desse benefício fiscal já é objeto de grande debate e deve ser analisada com detalhes. Para tanto, é necessário separar os setores contemplados pelo PERSE em dois grupos.

O PRIMEIRO GRUPO é integrado pelos setores que não necessitam, segundo as definições do Ministério da Economia de inscrição no CADASTUR. Os CNAEs contemplados são os seguintes:

CNAEDescrição
1813-0/01IMPRESSÃO DE MATERIAL PARA USO PUBLICITÁRIO
4330-4/02INSTALAÇÃO DE PORTAS, JANELAS, TETOS, DIVISÓRIAS E ARMÁRIOS EMBUTIDOS DE QUALQUER MATERIAL
4689-3/99COMÉRCIO ATACADISTA ESPECIALIZADO EM OUTROS PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE
5211-7-99DEPÓSITOS DE MERCADORIAS PARA TERCEIROS, EXCETO ARMAZÉNS GERAIS E GUARDA-MÓVEIS
5510-8/01HOTÉIS
5510-8/02APART HOTÉIS
5590-6/01ALBERGUES, EXCETO ASSISTENCIAIS
5590-6/02CAMPINGS
5590-6/03PENSÕES (ALOJAMENTO)
5590-6/99OUTROS ALOJAMENTOS NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE
5620-1/01FORNECIMENTO DE ALIMENTOS PREPARADOS PREPONDERANTEMENTE PARA EMPRESAS
5620-1/02SERVIÇOS DE ALIMENTAÇÃO PARA EVENTOS E RECEPÇÕES – BUFÊ
5911-1/02PRODUTORA DE FILMES PARA PUBLICIDADE
5914-6/00ATIVIDADES DE EXIBIÇÃO CINEMATOGRÁFICA
7312-2/00AGENCIAMENTO DE ESPAÇOS PARA PUBLICIDADE, EXCETO EM VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO
7319-0/01CRIAÇÃO ESTANDES PARA FEIRAS E EXPOSIÇÕES
7420-0/01ATIVIDADES DE PRODUÇÃO DE FOTOGRAFIAS, EXCETO AÉREA E SUBMARINA
7420-0/04FILMAGEM DE FESTAS E EVENTOS
7490-1/01SERVIÇOS DE TRADUÇÃO, INTERPRETAÇÃO E SIMILARES
7490-1/04ATIVIDADES DE INTERMEDIAÇÃO E AGENCIAMENTO DE SERVIÇOS E NEGÓCIOS EM GERAL, EXCETO IMOBILIÁRIOS
7490-1/05AGENCIAMENTO DE PROFISSIONAIS PARA ATIVIDADES ESPORTIVAS, CULTURAIS E ARTÍSTICAS
7721-7/00ALUGUEL DE EQUIPAMENTOS RECREATIVOS E ESPORTIVO
7729-2/02ALUGUEL DE MÓVEIS, UTENSÍLIOS E APARELHOS DE USO DOMÉSTICO E PESSOAL; INSTRUMENTOS MUSICAIS
7733-1/00ALUGUEL DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS PARA ESCRITÓRIOS
7739-0/03ALUGUEL DE PALCOS, COBERTURAS E OUTRAS ESTRUTURAS DE USO TEMPORÁRIO, EXCETO ANDAIMES
7739-0/99ALUGUEL DE OUTRAS MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS COMERCIAIS E INDUSTRIAIS NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE, SEM OPERADOR
7810-8/00SELEÇÃO E AGENCIAMENTO DE MÃO DE OBRA
8011-1/01ATIVIDADES DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA PRIVADA
8111-7/00SERVIÇOS COMBINADOS PARA APOIO A EDIFÍCIOS, EXCETO CONDOMÍNIOS PREDIAIS
8230-0/01SERVIÇOS DE ORGANIZAÇÃO DE FEIRAS, CONGRESSOS, EXPOSIÇÕES E FESTAS
8230-0/02CASAS DE FESTAS E EVENTOS
8592-9/01ENSINO DE DANÇA
9001-9/01PRODUÇÃO TEATRAL
9001-9/02PRODUÇÃO MUSICAL
9001-9/03PRODUÇÃO DE ESPETÁCULOS DE DANÇA
9001-9/04PRODUÇÃO DE ESPETÁCULOS CIRCENSES, DE MARIONETES E SIMILARES
9001-9/06ATIVIDADES DE SONORIZAÇÃO E DE ILUMINAÇÃO
9001-9/99ARTES CÊNICAS, ESPETÁCULOS E ATIVIDADES COMPLEMENTARES NÃO ESPECIFICADAS ANTERIORMENTE
9003-5/00GESTÃO DE ESPAÇOS PARA ARTES CÊNICAS, ESPETÁCULOS E OUTRAS ATIVIDADES ARTÍSTICAS
9311-5/00GESTÃO DE INSTALAÇÕES DE ESPORTES
9312-3/00CLUBES SOCIAIS, ESPORTIVOS E SIMILARES
9319-1/01PRODUÇÃO E PROMOÇÃO DE EVENTOS ESPORTIVOS
9329-8/01DISCOTECAS, DANCETERIAS, SALÕES DE DANÇA E SIMILARES

Por outro lado, o Ministério da Econômica também elencou um grupo de setores que necessitam de inscrição no CADASTUR na data de publicação da Lei nº 14.148/2021. Os CNAEs desse SEGUNDO GRUPO são os seguintes:

CNAEDescrição
0311-6/04ATIVIDADES DE APOIO A PESCA EM ÁGUA SALGADA
0312-4/04ATIVIDADES DE APOIO A PESCA EM ÁGUA DOCE
1112-7/00FABRICAÇÃO DE VINHO
2869-1/00FABRICAÇÃO DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS PARA USO INDUSTRIAL ESPECÍFICO NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE, PEÇAS E ACESSÓRIOS
3317-1/01MANUTENÇÃO E REPARAÇÃO DE EMBARCAÇÕES E ESTRUTURAS FLUTUANTES
3317-1/02MANUTENÇÃO E REPARAÇÃO DE EMBARCAÇÕES PARA ESPORTE E LAZER
4763-6/05COMÉRCIO VAREJISTA DE EMBARCAÇÕES E OUTROS VEÍCULOS RECREATIVOS; PEÇAS E ACESSÓRIOS
4789-0/01COMÉRCIO VAREJISTA DE SUVENIRES, BIJUTERIAS E ARTESANATOS
4923-0/02SERVIÇO DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS – LOCAÇÃO DE AUTOMÓVEIS COM MOTORISTA
4929-9/01TRANSPORTE RODOVIÁRIO COLETIVO DE PASSAGEIROS, SOB REGIME DE FRETAMENTO, MUNICIPAL
4929-9/02TRANSPORTE RODOVIÁRIO COLETIVO DE PASSAGEIROS, SOB REGIME DE FRETAMENTO, INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL E INTERNACIONAL
4929-9/03ORGANIZAÇÃO DE EXCURSÕES EM VEÍCULOS RODOVIÁRIOS PRÓPRIOS, MUNICIPAL
4929-9/04ORGANIZAÇÃO DE EXCURSÕES EM VEÍCULOS RODOVIÁRIOS PRÓPRIOS, INTERMUNICIPAL, INTERESTADUAL E INTERNACIONAL
5011-4/02TRANSPORTE MARÍTIMO DE CABOTAGEM – PASSAGEIROS
5012-2/02TRANSPORTE MARÍTIMO DE LONGO CURSO – PASSAGEIROS
5099-8/01TRANSPORTE AQUAVIÁRIO PARA PASSEIOS TURÍSTICOS
5030-1/01NAVEGAÇÃO DE APOIO MARÍTIMO
5030-1/02NAVEGAÇÃO DE APOIO PORTUÁRIO
5030-1/03SERVIÇO DE REBOCADORES E EMPURRADORES
5112-9/99OUTROS SERVIÇOS DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS NÃO REGULAR
5231-1/01ADMINISTRAÇÃO DA INFRAESTRUTURA PORTUÁRIA
5231-1/02ATIVIDADES DO OPERADOR PORTUÁRIO
5611-2/01RESTAURANTES E SIMILARES
5611-2/03LANCHONETES, CASAS DE CHÁ, DE SUCOS E SIMILARES
5611-2/04BARES E OUTROS ESTABELECIMENTOS ESPECIALIZADOS EM SERVIR BEBIDAS, SEM ENTRETENIMENTO
5611-2/05BARES E OUTROS ESTABELECIMENTOS ESPECIALIZADOS EM SERVIR BEBIDAS, COM ENTRETENIMENTO
7020-4/00ATIVIDADES DE CONSULTORIA EM GESTÃO EMPRESARIAL, EXCETO CONSULTORIA TÉCNICA ESPECÍFICA
7319-0/04CONSULTORIA EM PUBLICIDADE
7490-1/02ESCAFANDRIA E MERGULHO
7490-1/99OUTRAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS, CIENTÍFICAS E TÉCNICAS NÃO ESPECIFICADAS ANTERIORMENTE
7711-0/00LOCAÇÃO DE AUTOMÓVEIS SEM CONDUTOR
7719-5/99LOCAÇÃO DE OUTROS MEIOS DE TRANSPORTE NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE, SEM CONDUTOR
7911-2/00AGÊNCIAS DE VIAGEM
7912-1/00OPERADORES TURÍSTICOS
7990-2/00SERVIÇOS DE RESERVAS E OUTROS SERVIÇOS DE TURISMO NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE
8591-1/00ENSINO DE ESPORTES
8592-9/99ENSINO DE ARTE E CULTURA NÃO ESPECIFICADO ANTERIORMENTE
9002-7/01ATIVIDADES DE ARTISTAS PLÁSTICOS, JORNALISTAS INDEPENDENTES E ESCRITORES
9102-3/01ATIVIDADES DE MUSEUS E DE EXPLORAÇÃO DE LUGARES E PRÉDIOS HISTÓRICOS E ATRAÇÕES SIMILARES
9103-1/00ATIVIDADES DE JARDINS BOTÂNICOS, ZOOLOGICOS, PARQUES NACIONAIS, RESERVAS ECOLÓGICAS E ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL
9319-1/99OUTRAS ATIVIDADES ESPORTIVAS NÃO ESPECIFICADAS ANTERIORMENTE
9321-2/00PARQUES DE DIVERSÃO E PARQUES TEMÁTICOS
9329-8/04EXPLORAÇÃO DE JOGOS ELETRÔNICOS RECREATIVOS
9329-8/99OUTRAS ATIVIDADES DE RECREAÇÃO E LAZER NÃO ESPECIFICADAS ANTERIORMENTE
9493-6/00ATIVIDADES DE ORGANIZAÇÕES ASSOCIATIVAS LIGADAS À CULTURA E À ARTE

Quais as controvérsias que envolvem o primeiro grupo?

Seguindo o que estava previsto na Lei instituidora do PERSE, a Portaria ME Nº 7.163 elencou os ramos de atividade pertencentes ao setor de eventos. Ocorre que, ao definir os CNAEs beneficiados pelo PERSE, pode-se perceber quer certos CNAEs fazem referências a atividades que não possuem correlação obrigatória com o setor de eventos. Como exemplo, podemos citar as seguintes atividades: ATIVIDADES DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA PRIVADA, ALUGUEL DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS PARA ESCRITÓRIOS, COMÉRCIO ATACADISTA ESPECIALIZADO EM OUTROS PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS NÃO ESPECIFICADOS ANTERIORMENTE.

Diante dessa realidade, há legítima insegurança no que se refere ao aproveitamento da redução a zero das alíquotas do IRPJ,CSLL, PIS e COFINS por empresas que, apesar de desenvolverem atividades contempladas pela Portaria, não possuem receitas decorrentes do setor de eventos ou turismo.

No entanto, apesar desse cenário, é possível que todas as empresas que tiveram o CNAE contemplado na Portaria aproveitem a redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS mediante pronunciamento administrativo ou judicial específico sobre a aplicação do benefício, levando-se em consideração as peculiaridades de cada caso concreto.

Além disso, segundo disposição expressa da Portaria, apenas as empresas que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148/2021, poderão usufruir da redução a zero das alíquotas do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS. No entanto, a Lei instituidora do PERSE não dispôs sobre qualquer requisito temporal para fruição da redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Importante relembrar que é vedado que atos infralegais, ao pretexto de regulamentar a lei, instituam requisitos para fruição de benefício não previstos originariamente na lei. Dessa forma, não restam dúvidas que há fortes fundamentos jurídicos para as empresas interessadas pleitearem o afastamento desse requisito temporal junto ao Poder Judiciário.

Por fim, outro ponto objeto de controvérsia diz respeito à possibilidade de empresas que apenas possuem CNAEs secundários contemplados na Portaria. A dúvida que fica é se essas empresas poderão reduzir a zero, de forma proporcional, as alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS das receitas decorrentes das atividades contempladas pela Portaria. Sobre esse ponto, é necessário que as empresas avaliem qual a melhor forma de conseguir a extensão do benefício, avaliação que deverá levar em conta as peculiaridades de cada caso concreto.

Quais as controvérsias que envolvem o Segundo grupo?

Primeiramente, é importante destacar que todas as controvérsias indicadas no tópico anterior também envolvem o segundo grupo dos setores econômicos identificados na Portaria. Assim, para evitar desnecessária repetição, os argumentos e explicações já expostos não serão repetidos.

Superada essa questão, importante ressaltar que a Portaria ME Nº 7.163, no que se refere ao segundo grupo indicado, restringiu o aproveitamento da redução a zero das alíquotas do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS.

Nesse sentido, restou consignado que as empresas do segundo grupo apenas poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no CADASTUR. Ou seja, segundo a Portaria ME Nº 7.163, é necessário que a empresa estivesse cadastrada no CADASTUR no dia 3 de maio de 2021 para que possa usufruir dos benefícios do PERSE. No entanto, conforme será demonstrado, esse requisito é ilegal e pode ser afastado pelo Poder Judiciário.

O CADASTUR, segundo informações do Governo Federal, é o cadastro de pessoas físicas e jurídicas que atuam no setor turístico. No entanto, é necessário deixar claro que, conforme é possível concluir a partir da análise das empresas que se encontram cadastradas no CADASTUR, não é necessário que o interessado desenvolva uma atividade diretamente ligada ao turismo para ter sua inscrição aprovada. Como exemplo, existem diversos bares e restaurantes que, apesar de não estarem localizados em cidades turísticas, tiveram sua inscrição aprovada.

Uma vez aprovada a inscrição no CADASTUR, abre-se caminho para discussão judicial sobre a imposição de limite temporal pela Portaria ME Nº 7.163. Para afastar a necessidade de estar cadastrada no CADASTUR em 3 de maio de 2021, as empresas podem recorrer ao Poder Judiciário. A argumentação jurídica consiste em demonstrar que ato infralegal não pode estabelecer contrair a própria lei que pretende regulamentar. Ou seja, a Portaria ME Nº 7.163 não poderia ter instituído requisito temporal não previsto originariamente na Lei nº 14.148/2021.

Analisando as decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região sobre o tema, já é possível encontrar posicionamentos no sentido de que, como o cadastro dos restaurantes no Ministério do Turismo é facultativo, a exigência do prévio cadastramento, prevista no §2º do art. 1º da Portaria nº 7.381/10, para o efeito de enquadrar-se no PERSE, acaba restringindo o objetivo da Lei nº 14.148/21, que é o de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

Por tais razões, as empresas que possuem o CNAE elencado no segundo grupo e que não estavam cadastradas no CADASTUR em 3 de maio de 2021, podem recorrer ao Poder Judiciário para afastar a ilegalidade do requisito temporal estabelecido pela Portaria ME Nº 7.163, o que poderá resultar no não pagamento de impostos e contribuições federais pelos próximos 60 meses.

Empresas do Simples Nacional podem reduzir a zero as alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS?

Essa é mais uma grande controvérsia da Lei do PERSE. A questão se resume em saber se as empresas optantes pelo SIMPLES Nacional podem cumular a opção pelo regime diferenciado de recolhimento de tributos com a redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

A controvérsia sobre a possibilidade de extensão do benefício fiscal às empresas optantes pelo Simples Nacional decorre da redação do art.  24, §1º, da Lei Complementar 123/2006, o qual prevê que não serão consideradas quaisquer alterações em bases de cálculo, alíquotas e percentuais ou outros fatores que alterem o valor de imposto ou contribuição apurado na forma do Simples Nacional exceto as previstas ou autorizadas na referida Lei Complementar.

No entanto, é preciso lembrar que o art. 146, inciso III, “d” da Constituição Federal determina que seja concedido tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte. Seguindo essa linha, não há dúvidas que, ao se realizar uma interpretação teleológica da Lei instituidora do PERSE, pode-se concluir que o favor fiscal também deve beneficiar todas as pessoas jurídicas integrantes dos setores elencados na Lei e na Portaria, independentemente do regime de tributação escolhido.

Por tais motivos, as empresas optantes pelo Simples Nacional possuem fortes argumentos jurídicos para buscar junto ao poder judiciário a aplicação do benefício fiscal de redução a zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Diante do exposto, é possível concluir que a Lei nº 14.148/2021 e sua posterior regulamentação pela Portaria ME Nº 7.163trouxeram, ao mesmo tempo, grandes oportunidades e incertezas às empresas, razão pela qual é necessário que todos os cenários sejam avaliados antes do aproveitamento da redução a zero das alíquotas do IRPJ, da CSLL e do PIS/COFINS.

Por Wagner Schneider Cemin

A (não) incidência de PIS e Cofins sobre as bonificações recebidas

Quando o adquirente apura o PIS e a Cofins pelo regime cumulativo, normalmente aquelas empresas sujeitas a tributação pelo lucro presumido, a base de cálculo do PIS e da Cofins é definida pela receita das operações próprias da empresa, ou seja, a receita decorrente da venda de mercadorias ou prestação de serviços. As bonificações, por serem contabilizadas como “outras receitas”, não compõem esta base cálculo.

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Imposto de renda sobre pensão alimentícia: inconstitucionalidade e julgamento pelo STF

Nos moldes da legislação do imposto de renda, Lei Federal nº 7.713/1988, art. 3º, §1º[1], submetem-se à incidência do imposto os valores recebidos a título de alimentos. Em contrapartida, é assegurado ao alimentante (quem paga a pensão alimentícia) a possibilidade de dedução do valor em sua declaração de imposto de renda.

A partir disso, poderia se sustentar que o recebimento de pensão alimentícia caracteriza acréscimo patrimonial. No entanto, esta premissa se revela equivocada e contrária aos princípios constitucionais que limitam o poder de tributar.

Primeiramente, verifica-se que o conceito de renda ou provento, pacificado entre a doutrina e a jurisprudência, paira na existência de acréscimo patrimonial[2]. De uma breve leitura dos artigos 153, III, da Constituição Federal[3] e 43 do Código Tributário Nacional[4], extrai-se que o imposto de renda incide na aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica do contribuinte.

No entendimento exarado por Carrazza, o princípio da capacidade contributiva transmite a ideia de que o imposto de renda só pode incidir sobre fatos que não exibam conteúdo econômico e não gravem riqueza nova do contribuinte. Ou seja, a lei não pode prever hipótese de incidência do imposto sobre fatos que sejam economicamente vazios[5].

E acrescenta, nos moldes dos princípios da capacidade contributiva e da não-confiscatoriedade que “o objetivo deste tributo é gravar cada pessoa não em função de suas despesas, nem de acordo com sua riqueza disponível num dado momento, mas sim, de acordo com o incremento de seu potencial econômico[6].”

Nessa toada, com base na análise da legislação ordinária, é possível vislumbrar que a atuação do legislador possui limitações previstas na própria Constituição Federal, ao delimitar a incidência do Imposto de Renda a “renda e proventos de qualquer natureza”, a interpretação deve ser realizada em consonância à hermenêutica constitucional.

A partir dessas premissas, é possível compreender que o imposto de renda não deveria incidir sobre verbas destinadas à sobrevivência, como é o caso da pensão alimentícia, que é fixada observando os princípios da necessidade e possibilidade. Ou seja, não caracteriza acréscimo patrimonial ao beneficiário.

A discussão acerca da tributação de pensão alimentícia foi levada ao Superior Tribunal Federal – STF por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5.422, proposta pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família -IBDFAM. De acordo com o IBDFAM, a alimentação tem previsão constitucional como direito social, de sorte que a cobrança de imposto sobre verbas de natureza alimentar na seara familiar, caracterizaria ofensa ao princípio da dignidade humana.

À vista da exposição sobre o conceito de renda, bem como os argumentos apresentados pelo IBDFAM na ADI, é evidente que a pensão alimentícia não se enquadra nessa concepção, sequer pode ser considerada acréscimo patrimonial, nos termos definidos pelo Código Tributário Nacional. Logo, haja vista que para incidir o imposto de renda, o fato gerador consiste em auferir renda, aumentar o patrimônio do contribuinte, não se verifica a hipótese de incidência.

Outrossim, cumpre salientar que os alimentos prestados pelo alimentante são caracterizados como verba a garantir a subsistência, de modo que a tributação da renda já foi realizada quando auferida pelo alimentante. Por conseguinte, exigir a tributação da referida verba seria hipótese explícita de bitributação.

Em que pese a tributação no caso em tela, possa ser encarada como uma forma de beneficiar o Fisco, não se pode olvidar que fomenta a disparidade social, tendo em vista que a parte hipossuficiente da relação, no caso o alimentando acaba pagando o imposto, que é restituído ao alimentante. Trata-se de uma afronta à garantia do mínimo existencial assegurada constitucionalmente.

Nesse diapasão, também pode ser compreendida como uma forma de contribuir para a desigualdade de gênero. Tal premissa surge em virtude de que na maioria dos casos na realidade do país, os homens são os devedores de pensão, enquanto as mulheres necessitam tributar os respectivos valores, ensejando uma situação de machismo tributário.[7]

 No julgamento sobredito, o relator, Ministro Dias Toffoli, acolheu o pedido da requerente e posicionou-se de modo favorável aos contribuintes, interpretando o caso nos moldes da Constituição Federal. A tese consolidada pelo Ministro é de que “é inconstitucional a incidência de imposto de renda sobre os alimentos ou pensões alimentícias quando fundados no direito de família”. Consoante o posicionamento de Toffoli, os alimentos recebidos são uma mera entrada de valores, não sujeitos à tributação.

Ainda, insta salientar que diante da conjuntura a beneficiar os contribuintes no julgamento do STF, esses teriam direito a obter a restituição referente aos últimos cinco anos pela via judicial, visto que esses valores nunca foram legitimamente devidos. Inclusive, consoante destacado pelo jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do IBDFAM, declarada a inconstitucionalidade, esta é imediata, sendo que os efeitos pendem da modulação que será aplicada pelos Ministros no encerramento da discussão[8].

No entanto, mesmo com a maioria formada no STF para declarar a inconstitucionalidade da incidência do imposto de renda sobre os valores recebidos pelo alimentando, o Ministro Gilmar Mendes pediu destaque, o que suspendeu o julgamento sobre o tema e ensejará nova contagem dos votos.

Dessa maneira, os contribuintes devem ficar atentos à designação de nova data para julgamento, que apresenta grande probabilidade de ser julgado favoravelmente aos beneficiários de pensão alimentícia, o que possibilitará a devolução dos valores pagos indevidamente. Por conseguinte, cumpre salientar que para tanto, é necessário utilizar da medida judicial cabível. 


Por Bruna Mattos Dias e Marina da Silva Costa 


[1] Art. 3º O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução, ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei. (Vide Lei 8.023, de 12.4.90). § 1º Constituem rendimento bruto todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, os alimentos e pensões percebidos em dinheiro, e ainda os proventos de qualquer natureza, assim também entendidos os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados.

[2] OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008.

[3] Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: […] III – renda e proventos de qualquer natureza;

[4] Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:  I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
   § 1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)
   § 2o Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)

[5] CARRAZZA, Roque Antonio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 115.

[6] CARRAZZA, Roque Antonio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). São Paulo: Malheiros Editores, 2009. p. 120.

[7] JOTA. STF retoma a partir de sexta-feira debate sobre tributação de pensão alimentícia. Disponível em: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/pensao-alimenticia-stf-retoma-debate-tributacao-02022022.

[8] IBDFAM. STF forma maioria para afastar incidência do imposto de renda sobre pensão alimentícia; ação está suspensa após pedido de destaque. Disponível em: https://ibdfam.org.br/noticias/9342/STF+forma+maioria+para+afastar+incid%C3%AAncia+do+imposto+de+renda+sobre+pens%C3%A3o+aliment%C3%ADcia%3B+a%C3%A7%C3%A3o+foi+movida+pelo+IBDFAM.

A inconstitucional base de cálculo dupla para apuração do DIFAL

A inconstitucionalidade da cobrança do DIFAL vai além da violação ao princípio da anterioridade anual. A indevida majoração da base de cálculo em razão da instituição de base dupla para apuração do DIFAL-Contribuintes ou DIFAL-Não Contribuintes, seja por meio da LC 190/22, ou de quaisquer legislações estaduais, é outro fundamento que fortalece a inconstitucionalidade da exação

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