1ª Turma do STJ confere nova interpretação a tratados para evitar a bitributação

Corte analisou convenções celebradas pelo Brasil com Alemanha, Argentina e China

Em julgamento encerrado no último mês de outubro, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, deu provimento ao recurso especial da Fazenda Nacional para autorizar a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) em remessas ao exterior realizadas por empresas brasileiras como contrapartida de serviços prestados sem transferência de tecnologia por empresas na Alemanha, Argentina e China, que não possuem estabelecimento permanente no Brasil.

Trata-se do Recurso Especial 1.753.262/SP, distribuído à relatoria do ministro Benedito Gonçalves, prolator do voto condutor do acórdão.

Apesar de o Brasil não ser membro da OCDE, o país tem adotado o modelo proposto por esta organização para a celebração de tratados internacionais tributários, cuja finalidade mais relevante consiste na distribuição, entre os países signatários, de competências para cobrar Imposto de Renda sobre determinados tipos de rendimentos.

Segundo essa diretriz, os lucros de uma empresa de um Estado Contratante são tributáveis neste mesmo Estado (competência do local onde a sociedade contratada estiver domiciliada), salvo se a empresa exercer sua atividade em outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado. Neste caso, os lucros serão tributáveis no outro Estado Contratante, mas unicamente na medida em que corresponderem a esse estabelecimento permanente. É o que dispõe o artigo 7º das convenções tributárias brasileiras, a respeito dos “lucros das empresas”.

Nesse contexto, considerando que a remuneração pelos serviços administrativos prestados sem transferência de tecnologia se enquadra no conceito trazido no artigo 7º dos tratados internacionais para evitar a dupla tributação celebrados pelo nosso país com os referidos países, no caso analisado pelo STJ o contribuinte defendeu a ausência de competência do Brasil para exigir o IRRF sobre os pagamentos efetuados em favor das empresas estrangeiras, diante da competência exclusiva do país de residência do prestador para a tributação da renda, valendo-se, inclusive, da jurisprudência consolidada da Corte sobre a matéria.

A Fazenda Nacional, por sua vez, inicialmente defendeu o enquadramento destes pagamentos aos artigos 21 e 22 dos tratados internacionais, que tratam de “outros rendimentos” e autorizam a tributação no Brasil, com  o argumento de que tais valores não comporiam o lucro das empresas estrangeiras e, assim, não poderiam ser enquadrados no artigo 7º dos tratados.

Já em fase recursal, a Fazenda inovou os seus argumentos ao defender que os serviços administrativos prestados pelas empresas no exterior se tratavam de “serviços técnicos e de assistência técnica”, ainda que sem transferência de tecnologia, cujo tratamento deveria ser equiparado a royalties para fins de incidência do IRRF, por força dos protocolos anexos aos tratados internacionais em questão, que preveem a aplicação das disposições relativas aos royalties aos rendimentos provenientes da prestação de assistência técnica e serviços técnicos.

Na ocasião do julgamento no STJ, a matéria foi apreciada sob este novo prisma pelos eminentes ministros da Corte.

O Colegiado afirmou ser “incontroverso que se trata de rendimentos provenientes da prestação de serviços técnicos ou assistência técnica, sem transferência de tecnologia”, diante do que decidiu dar provimento ao recurso especial fazendário, com o entendimento de que as convenções firmadas pelo Brasil com Alemanha, Argentina e China estabelecem, em seus protocolos adicionais, que aos rendimentos provenientes de serviços de assistência técnica e serviços técnicos são aplicáveis os artigos 12 das referidas convenções, que tratam da tributação de royalties – cujos pagamentos são caracterizados pela transferência do direito de uso, gozo ou fruição de um direito –, de modo que estariam sujeitos à tributação no Brasil. Esse foi a questão de grande relevância não observada na decisão.

Segundo o voto-vista proferido na ocasião do julgamento pela ministra Regina Helena Costa, “os protocolos anexos dos tratados firmados com a Alemanha, Argentina e China estabelecem, respectivamente, uma nítida equiparação de tais rendimentos”, razão pela qual estaria, no caso, autorizada a tributação no Brasil.

Assim, por entenderem que o Brasil teria intencionalmente se afastado do modelo-padrão da OCDE, com vistas a atender os interesses brasileiros enquanto país majoritariamente importador dos serviços aqui tratados, concluíram os eminentes ministros da 1ª Turma que “não se aplicam aos rendimentos em questão as disposições dos artigos 7 dos tratados em testilha”.

Apesar de não possuir efeito vinculante, referido precedente merece atenção porque nitidamente altera a reiterada e acertada jurisprudência do STJ acerca da matéria, que reconhece a não incidência de IRRF sobre os pagamentos remetidos ao exterior em decorrência de serviços prestados sem transferência de tecnologia, inclusive, em casos análogos a este em análise, envolvendo a aplicação de tratados internacionais compostos por protocolo adicional (vide REsp 1.475.779/RS e  REsp 1.890.708/SP).

Contudo, não sendo esta a conclusão alcançada pelos ministros da 1ª Turma no julgamento do REsp 1.753.262/SP, os quais consideraram “irrelevante a existência de transferência de tecnologia” para fins de aplicação da chamada “cláusula de equiparação” prevista nos protocolos adicionais dos tratados internacionais, o contribuinte opôs embargos de declaração apontando vícios no julgado que dizem respeito à natureza dos serviços efetivamente prestados no caso concreto (correspondentes a serviços administrativos, e não serviços técnicos ou de assistência técnica, sendo esta a premissa que fundamentou o acórdão), bem como requerendo a modulação de efeitos do julgamento de mérito, na medida em que o recente entendimento exarado pela 1ª Turma contraria o posicionamento consolidado da Corte sobre a matéria, configurando inequívoca alteração jurisprudencial. Referido recurso encontra-se pendente de julgamento no âmbito da 1ª Turma e requer um acompanhamento especial por parte dos contribuintes, já que o Colegiado terá uma nova oportunidade de se debruçar sobre o assunto para definir importantes contornos da presente questão jurídica.

A esse respeito, é importante que o STJ enfrente, ainda, a própria definição de royalties trazida pelos tratados internacionais, que descarta qualquer possibilidade de equiparação entre o tratamento fiscal dos royalties e aquele atribuído à prestação de serviços de qualquer natureza.

Conforme parecer da lavra do professor-doutor Sergio André Rocha, acostado ao recurso aqui tratado[1], “o que se buscou com a regra do protocolo foi simplesmente evitar a fragmentação contratual em casos onde a prestação de serviços fosse meramente acessória ou instrumental a contratos tipicamente remunerados mediante o pagamento de royalties“. Assim, “independentemente do conceito de serviço técnico, o mesmo somente poderá ser tratado como royalty caso haja uma relação entre o serviço e um fato econômico que tipicamente se enquadre como tal”.

A apreciação de tais pontos é demasiadamente relevante para o correto enfrentamento da controvérsia.

[1] ROCHA, Sergio André. Parecer. Contratação de serviços de assistência administrativa sem transferência de tecnologia prestados por residentes na Argentina e na China. Qualificação no artigo 7º do tratado tributário celebrado entre o Brasil e estes países. Inexistência de estabelecimento permanente no país da fonte dos rendimentos. Ausência de competência do Brasil para tributar tais rendimentos. Tributação exclusiva nos países de residência das entidades prestadoras. Jul./ 2023.

Fonte: Jota

Carf permite incidência de Cide sobre remessas de royalties de direitos autorais

Para o colegiado, a legislação define que há incidência da contribuição sobre royalties a qualquer título

Por sete votos a um, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) permitiu a incidência de Cide sobre a remessa ao exterior de royalties relativos à exploração de direitos autorais. Para o colegiado, a legislação define que há incidência da contribuição sobre royalties a qualquer título. Os processos são o 10805.725776/2017-81 e o 10805.724816/2016-96.

A discussão é sobre o parágrafo segundo, artigo segundo da Lei 10.168/00, que determina a incidência de Cide sobre pessoas jurídicas que “pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou remeterem royalties, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior”. Na turma ordinária, se considerou que o artigo 10 do Decreto 4.195/02 interpretou a legislação sem incluir os royalties de direitos autorais entre os que teriam incidência de Cide, sendo dado provimento ao recurso do contribuinte.

Para a relatora na Câmara Superior, conselheira Liziane Angelotti Meira, a lista de royalties constante no decreto seria exemplificativa, não exaustiva. Além disso, a julgadora citou o artigo 97 do CTN, que entre outros pontos define que apenas lei pode definir o fato gerador de obrigação tributária, e o artigo 99, que prevê que o conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis.

Paulo Zavascki, do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados, disse que interpreta a lista do decreto como taxativa, mas que ainda que se interpretasse como exemplificativa, a Cide prevista na 10168/00 tem finalidade de estimular o desenvolvimento tecnológico, que não seria relacionado aos direitos autorais. “Ainda que fosse exemplificativo, direitos autorais nada têm a ver com desenvolvimento de tecnologia”, afirmou.

O único posicionamento divergente foi o da conselheira Tatiana Josefovicz Belisário, que argumentou ter entendimento diferente há alguns anos.

Fonte: Jota

Por voto de qualidade, Carf mantém tributação sobre lucros no exterior

Julgador considerou que a convenção internacional para evitar bitributação e a MP 2158-35/01 são compatíveis

Com aplicação do voto de qualidade, a 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve a tributação de IRPJ e CSLL sobre lucros de controladas no exterior. O processo é o 16643.720051/2013-59.

No mês passado, a turma decidiu da mesma maneira sobre o tema, em casos como o 16682.720429/2018-62, da Petrobras. O processo tem valor de R$ 178 milhões.

O conselheiro Fernando Brasil de Oliveira Pinto, relator do caso, ressaltou que a matéria já era conhecida da turma e já tinha se pronunciado sobre o tema. Em julgamentos de outubro, o julgador considerou que não há incompatibilidade entre convenção internacional para evitar bitributação e a MP 2158-35/01, que prevê que os lucros no exterior serão considerados disponibilizados no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados. Da mesma forma, o conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli também destacou que o tema já era conhecido, abriu divergência e votou pela impossibilidade da tributação.

Ainda no mesmo processo, a turma, por seis votos a dois, entendeu que, para a tributação de filiais e sucursais de controle indireto no exterior, é necessária a consolidação no balanço prevista no parágrafo sexto, artigo primeiro da Instrução Normativa 213/02. A decisão da turma foi por enviar o processo para primeira instância para análise da documentação.

Também no mesmo caso, mas por unanimidade, o colegiado afastou a limitação de dois anos para compensação de impostos pagos no exterior. O processo deve retornar para a primeira instância para exame dos documentos apresentados pelo contribuinte.

Fonte: Jota

PGFN facilitará o acesso a pareceres tributários

Textos serão divididos por temas e disponibilizados em portal próprio. Hoje, contribuintes podem ter dificuldade em encontrar os pareceres

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) facilitará o acesso aos pareceres produzidos por suas equipes. Os textos — que passam da casa dos mil — ficarão disponíveis em um portal, que será lançado na próxima quarta-feira (22/11).

A medida é vista como positiva, por trazer mais transparência à atividade da procuradoria. Hoje, apesar de os pareceres serem públicos, interessados encontram dificuldades para encontrá-los. O acesso aos pareceres poderá auxiliar, por exemplo, em situações em que órgãos do Executivo Federal — como PGFN e Receita — adotam posicionamentos distintos sobre o mesmo assunto, ou quando algum procurador toma uma atitude que contraria o entendimento da própria PGFN.

O lançamento do portal com os pareceres é uma iniciativa da PGFN no âmbito da Câmara de Promoção de Segurança Jurídica no Ambiente de Negócios. Regulamentada pela Portaria da Advocacia-Geral da União (AGU) 110/23, a câmara tem como objetivos, entre outros, prevenir e reduzir a litigiosidade e facilitar a articulação entre órgãos e entidades da administração pública federal.

Segundo o assessor tributário do advogado-geral da União, Leonardo Alvim, todos os pareceres não sigilosos serão publicizados, e será possível a consulta a partir dos seus temas. Alvim destaca que a disponibilização dos textos é uma estratégia para a harmonização de entendimentos. “Hoje temos falta de harmonia, às vezes, entre pareceres ou entendimentos jurídicos da PGFN com consultorias jurídicas de outros ministérios, que não o Ministério da Fazenda. Ou eventualmente entre a PGFN e a Receita Federal. Para que isso não aconteça mais, os contribuintes vão poder trazer [o assunto] para o comitê tributário [da Câmara de Promoção de Segurança Jurídica no Ambiente de Negócios]”, diz.

A ideia, segundo Alvim, é que haja alinhamento entre os órgãos, e os contribuintes conheçam o entendimento da União sobre os temas. Caso não haja consenso, é possível à AGU redigir um parecer e submeter à presidência da República.

Quando assinados pelo procurador-geral da Fazenda Nacional, os pareceres da PGFN são vinculantes aos procuradores. A disponibilização, assim, poderá ser útil para a identificação de eventuais posicionamentos de integrantes da procuradoria que contrariem a posição da própria PGFN. Ainda, de acordo com Alvim, será mais fácil identificar a existência de pareceres contraditórios.

Os pareceres são feitos, em geral, como resposta a consultas feitas por unidades da PGFN ou por órgãos do Ministério da Fazenda. Atualmente, entretanto, o caminho para chegar até eles pode não ser simples. “Os pareceres que são públicos, se o contribuinte fizer pedido via Lei de Acesso à Informação, ou se ele procurar por palavras, é possível que ele encontre. Mas os pareceres hoje não são indexados por temas”, afirma Alvim.

A iniciativa é alvo de elogios por tributaristas ouvidos pelo JOTA. “A transparência sempre é uma medida necessária. Por mais que não concordemos com algumas posições da Fazenda, é melhor saber as razões, a fundamentação de suas decisões, do que navegar no escuro”, define a advogada Cristiane Romano, sócia do Machado Meyer Advogados.

Já a advogada Maysa Pittondo, sócia da CPMG Advocacia e da Numeris Consultoria, salienta que a disponibilização será útil para identificar, por exemplo, as situações em que, frente à jurisprudência pacificada sobre um determinado tema, a PGFN optou por não recorrer, ou para entender a interpretação da procuradoria dos precedentes do STJ ou do STF tomados em recursos repetitivos ou repercussão geral. “[A divulgação] gera segurança e confiança na informação de quais são os parecer vigentes”, afirma.

O projeto de sistematização dos pareceres será lançado em 22 de novembro, quando a Câmara de Promoção de Segurança Jurídica no Ambiente de Negócios será oficialmente iniciada. Participarão do evento de lançamento, além da procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Ruas Almeida, o advogado-geral da União, Jorge Messias e a secretária-geral de consultoria da AGU, Clarice Calixto, que também ocupa o cargo de presidente da câmara.

No mesmo dia, a PGFN ouvirá entidades sobre os temas que poderão, futuramente, ser objeto de transações tributárias. Paralelamente, há uma consulta pública aberta em relação à transação de casos envolvendo a cobrança de IRPJ e CSLL sobre lucros de controladas no exterior. A data final para a apresentação de contribuições, que originalmente era 14 de novembro, foi prorrogada para 17 de novembro.

Fonte: Jota

STJ: contribuição extraordinária à previdência privada não é dedutível do IRPF

Prevaleceu entendimento do relator, para quem contribuições ordinária e extraordinária possuem natureza distinta

Por unanimidade, os ministros da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram pela impossibilidade de dedução das contribuições extraordinárias à previdência privada da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). O processo julgado foi o Resp 1.937.545/PB.

As contribuições extraordinárias são aquelas destinadas a cobrir déficits do plano e arcar com outras despesas. Prevaleceu o entendimento do relator, o ministro Francisco Falcão, para quem as contribuições ordinária e extraordinária possuem natureza distinta.

A decisão do colegiado nesta quinta-feira (9/11) diverge da adotada pela 1ª Turma em setembro em relação ao tema, no julgamento do AREsp 1890367/RJ. Na ocasião, a turma votou pela dedutibilidade de forma unânime, respeitado o limite legal de 12%. Quando as turmas de Direito Público do STJ discordam em uma questão, há a possibilidade de o tema ser levado à 1ª Seção da Corte, que atua para dirimir a divergência e pacificar a jurisprudência.

A posição desfavorável aos contribuintes na 2ª Turma se deu após a ministra Assusete Magalhães proferir voto-vista acompanhando o entendimento de Francisco Falcão.

Magalhães destacou que decidiu pedir vista porque seria a primeira vez que o colegiado se debruça sobre o tema. “É matéria que a 2ª Turma ainda não apreciou. Quando pedi vista deste processo não havia, no STJ, julgamento colegiado. Em setembro, houve precedente da 1ª Turma, que decidiu contrariamente à posição do ministro Francisco Falcão”, disse.

Teses

A julgadora afirmou que, após estudar as duas teses, decidiu seguir o entendimento de Falcão. “Eu me convenci do acerto do voto do ministro Francisco Falcão. Muito bem fundamentado, mostra a diferença entre as contribuições ordinária e extraordinária. O artigo 19 da LC [Lei Complementar] 109/2001 traz, a meu ver, claramente as diferenças entre as duas contribuições e a finalidade de cada uma delas”, declarou.

Conforme o dispositivo, as contribuições previdenciárias são classificadas como normais, que são aquelas destinadas ao custeio dos benefícios do plano, e extraordinárias, destinadas ao custeio de déficits, serviços passados e outras finalidades não incluídas na contribuição normal. Assim como Magalhães, os demais ministros acompanharam o entendimento do relator. O resultado repetiu-se no julgamento do agravo interno no REsp 1991567/RN, sobre o mesmo tema.

Já a tese vencedora no julgamento do AREsp 1890367/RJ, na 1ª Turma, é de que as contribuições extraordinárias podem ser deduzidas da base do IRPF porque, assim como as ordinárias, visam garantir o pagamento do benefício previdenciário. O relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, observou que os valores pagos “não podem ter função outra senão a garantia de que o benefício [previdenciário] acordado seja adimplido”.

Fonte: Jota

Receita cobra de herdeiros IR sobre cotas de fundos fechados

Entendimento está em recente solução de consulta, que orienta os fiscais do país

A Receita Federal publicou um entendimento com impacto para herdeiros de cotas de fundos fechados de investimento multimercado. Marcou posição de que devem recolher o Imposto de Renda (IRPF) na transferência desse patrimônio para os seus nomes. A tributação ocorre se houver ganho de capital, ou seja, se o valor recebido for maior que o de aquisição declarado pelo investidor original – o pai ou a mãe, por exemplo.

No fim das contas, dizem advogados, esses herdeiros ficam sujeitos a dois impostos: o IRPF, devido à União, e o ITCMD, o imposto sobre doações e herança, exigido pelos Estados. A alíquota do IRPF varia de 15% a 22,5%, a depender do ganho obtido. A alíquota do ITCMD, por sua vez, pode chegar a 8%. Em São Paulo, é de 4%.

“O ITCMD é a regra e está ok. Mas sobre o IRPF existe respaldo em lei para discutir, por isso a manifestação da Receita é absurda”, afirma Alamy Candido, sócio da banca Candido Martins Advogados. “A autoridade fiscal interpreta a regra desconsiderando um fundamento legal, o que é muito grave”, acrescenta.

O Fisco se posicionou por meio da Solução de Consulta nº 245, publicada no dia 1º deste mês. Nela, a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) orienta os auditores fiscais do país a fiscalizarem o pagamento do Imposto de Renda sobre essas heranças.

Existem hoje, segundo o governo, 2,5 mil brasileiros com recursos em fundos fechados – que reúnem poucos cotistas e não são abertos ao público em geral. Eles acumulam, juntos, patrimônio de R$ 756,8 bilhões.

As novas regras de tributação de fundos fechados, aprovadas na Câmara dos Deputados e sob análise agora no Senado, podem minimizar o problema relacionado à herança, segundo advogados.

Pela norma atual, os rendimentos só são taxados no resgate das cotas. O Projeto de Lei nº 4.173 estende para os fundos fechados uma taxação periódica, nos meses de maio de novembro. É o chamado come-cotas, que já vale para outros tipos de fundos.

O montante aplicado no fundo, explicam especialistas, estará sempre atualizado a valor de mercado para fins de recolhimento do Imposto de Renda semestral. Logo, não haveria saldo relevante sem tributação para justificar um questionamento na transmissão do patrimônio por herança.

Os questionamentos, acrescentam, tendem a continuar, no entanto, para os fundos que, pelo projeto, estão excluídos do come-cotas, como os de investimento em direitos creditórios (FDIC) e os de investimento em ações (FIAs).

Advogados relatam que existe uma briga entre herdeiros e gestores dos fundos, que exigem que as cotas sejam transferidas a valor de mercado e o Imposto de Renda pago sobre o ganho de capital. Isso, dizem, acaba levando contribuintes a buscar aval na Justiça para o não recolhimento.

“A jurisprudência sobre o assunto ainda não é muito evoluída. Mas a judicialização é a solução para o investidor que se sentir lesado”, afirma Diogo Olm Ferreira, tributarista do VBSO Advogados.

A manifestação da Receita Federal veio em resposta justamente à consulta de dois herdeiros que discordaram da exigência do imposto feita pelo administrador do fundo.

Na solução de consulta, o órgão frisa que o espólio é o contribuinte, mas a responsabilidade por recolher o imposto é do administrador do fundo ou da instituição que intermediar recursos por conta e ordem de seus clientes.

Advogados de contribuintes argumentam que só haveria imposto a recolher no momento do resgate da aplicação financeira. Citam o artigo 23 da Lei nº 9.532, de 1997.

O dispositivo dá, segundo Juliana Cardoso, sócia do Humberto Sanches e Associados, uma opção ao contribuinte: transferir os bens a valor de mercado ou pelo valor informado na declaração do Imposto de Renda do falecido.

“A decisão de entrar com uma ação judicial varia de acordo com o perfil do cliente. Alguns preferem pelo montante alto envolvido. Mas fato é que orientamos que discuta porque a lei permite a transmissão do bem pelo montante original”, afirma.

Na solução de consulta, a Receita Federal, no entanto, afastou a aplicação do artigo 23. Entende que a transferência de cotas de fundos fechados por herança é um tipo de alienação do ativo, o que justifica a incidência do imposto sobre eventual ganho de capital.

Ao afastar a aplicação do dispositivo, a Receita afirma que o objetivo de permitir a transferência de patrimônio pelo custo de aquisição é evitar que os herdeiros tenham de alienar outros bens (que não os transferidos) para pagar o Imposto de Renda no ato da mudança de propriedade.

“Motivação totalmente inaplicável no caso de fundos de investimento que, sabidamente, possuem, em seu ativo, instrumentos financeiros dotados de liquidez suficiente para serem alienados (em mercado secundário), de forma a fazer face ao pagamento do Imposto sobre a Renda e sem qualquer necessidade de disposição de bens adicionais pelos herdeiros”, afirma a receita.

Existe um precedente recente da Justiça a favor da tese dos contribuintes. A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo, foi contra a exigência do imposto na transferência de cotas a uma viúva.

Os desembargadores entenderam que a sucessão por morte não pode ser considerada como resgate dos rendimentos financeiros (processo nº 5012411-08.2017.4.03.6100). A Fazenda Nacional recorreu dessa decisão, mas ainda não há decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Fonte: Valor Econômico

Por unanimidade, STJ afasta concomitância de multas isolada e de ofício

Prevaleceu entendimento de que o STJ tem precedentes que reconhecem a impossibilidade da concomitância de multas

Por unanimidade, os ministros da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entenderam que não é possível a cumulação das multas isolada e de ofício. Prevaleceu o voto do ministro Sérgio Kukina, que alegou que o STJ tem precedentes que reconhecem a impossibilidade da concomitância de multas.

O caso (REsp 1708819/RS) chegou ao STJ após a Célula Comércio e Importação de Auto Peças e Acessórios recorrer de decisão do TRF4. O tribunal de origem entendeu pela possibilidade de aplicação de multas administrativas relacionadas ao controle de importação (multas isoladas) de forma cumulativa às multas pela falta de recolhimento de tributos (multas de ofício). Conforme a decisão do tribunal, as penalidades têm “naturezas distintas”.

A representante da Fazenda Nacional, procuradora Caroline Marinho, defendeu em sustentação oral que as multas isoladas e de ofício se referem a situações distintas. Por isso, poderiam ser aplicadas de forma conjunta. Segundo ela, enquanto as primeiras são penalidade para o descumprimento de obrigação acessória, as multas de ofício se referem ao descumprimento da obrigação principal, ou seja, o não pagamento do tributo.

O ministro Sérgio Kukina acolheu o pedido da companhia, afastando as multas isoladas. O julgador alegou que, embora a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) tenha citado precedente de relatoria do ministro Mauro Campbell, da 2ª Turma, pela possibilidade de cumulação dos dois tipos de multa, a mesma turma tem outros precedentes pela impossibilidade de cumulação das penalidades. O entendimento foi seguido de forma unânime pelos demais ministros.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) recentemente reverteu posição em relação à concomitância de multas. Em julgamento em 5 de outubro, por voto de qualidade (desempate pelo presidente da turma), prevaleceu, na 1ª Turma da Câmara Superior, o entendimento pela possibilidade de cumulação das multas isoladas e de ofício. A mudança se deveu à alteração de posicionamento de uma das integrantes do colegiado.

Fonte: Jota

STJ autoriza aproveitamento de créditos de PIS/Cofins sobre ICMS-ST

Para relatora, creditamento deve ser admitido pois o tributo já foi recolhido na etapa anterior à aquisição do bem

Os ministros da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceram, por unanimidade, o direito do contribuinte de aproveitar créditos de PIS/Cofins sobre os valores pagos a título de ICMS-ST (substituição tributária) na etapa anterior.

A turma negou provimento ao recurso da Fazenda Nacional contra decisão monocrática da relatora, ministra Regina Helena Costa, favorável ao aproveitamento dos créditos. O processo julgado foi o 2.089.686/RS (AgInt).

Para a magistrada, o creditamento deve ser admitido para o substituído tributário, uma vez que este adquire as mercadorias acrescidas do custo do tributo recolhido na etapa anterior.

“A repercussão econômica onerosa do recolhimento antecipado do ICMS-ST, pelo substituto, é assimilada pelo substituído imediato na cadeia quando da aquisição do bem, a quem, todavia, não será facultado gerar crédito na saída da mercadoria (venda), devendo emitir a nota fiscal sem destaque do imposto estadual, tornando o tributo, nesse contexto, irrecuperável na escrita fiscal”, argumentou Costa na decisão monocrática.

Fonte: Jota

Maioria dos acordos com a PGFN prevê uso de prejuízo fiscal

Levantamento aponta uso de créditos em 68% dos 66 firmados no 1º semestre

A possibilidade de uso de prejuízo fiscal tem incentivado contribuintes a fechar acordos com a Fazenda Nacional – as chamadas transações tributárias. Levantamento do escritório Buttini Moraes Advogados, feito a pedido do Valor, mostra que em 68% dos 66 firmados no primeiro semestre há a previsão de adoção desses créditos para o pagamento de dívidas tributárias.

Entre janeiro e junho deste ano, 45 transações individuais foram fechadas com a possibilidade de uso dessa “moeda” no país, de acordo com o levantamento realizado com base em dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). De agosto – quando passou a ser possível essa medida – a dezembro de 2022, foram apenas 15.

O volume total de acordos também aumentou, na mesma base de comparação. Passou de 45 para 66 – com e sem uso de créditos de prejuízo fiscal.

“Os números mostram que o interesse do contribuinte em transacionar com a Fazenda Nacional está relacionado com a chance de usar o prejuízo fiscal”, afirma Sergio Villanova Vasconcelos, do Buttini Moraes Advogados. “Não é só pela redução de multa e juros, como ocorreu em parcelamentos passados, como o Refis, mas em não gerar desembolso de caixa.”

Ligia Ferreira de Faria, do mesmo escritório, acrescenta que “a transação tributária sem a possibilidade de uso de prejuízo fiscal não é interessante”. Para ela, levando-se em consideração a quantidade de devedores de tributos no Brasil, o número de acordos com a Fazenda Nacional poderia ser bem maior.

De acordo com a PGFN, R$ 58 bilhões foram regularizados até agora por meio de acordos individuais – pouco mais de 10% dos R$ 498,1 bilhões regularizados em todas as modalidades de transação desde 2020. O estoque atual da dívida ativa da União é de aproximadamente R$ 2,7 trilhões.

O uso de prejuízo fiscal do Imposto de Renda (IRPJ) e de base negativa de CSLL como “moeda” evita, na prática, desembolso de dinheiro pelos contribuintes. A Lei nº 14.375, de junho de 2022, autorizou a adoção desses créditos para a liquidação de 70% da dívida após descontos.

Mas existem limites. Além de ser a última “moeda” aceita nas transações, esse crédito só pode ser utilizado para pagar débitos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação, segundo a Portaria PGFN nº 6.757.

‘Empresariado tem resistido a fazer desembolsos de caixa diante das incertezas”
— Richard E. Dotoli

A regra, que passou a valer em agosto de 2022, beneficia empresas que, por avaliação da Fazenda Nacional, têm rating “C” ou “D”, e aquelas em recuperação judicial ou extrajudicial.

A autorização para o uso de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL nas transações individuais simplificadas de devedores em recuperação judicial ou extrajudicial passou a valer este mês, com a edição da Portaria PGFN nº 1.241. Até então, não havia essa possibilidade nessa modalidade de transação – direcionada a contribuintes com dívidas de R$ 1 milhão até R$ 10 milhões.

A PGFN, em nota ao Valor, justifica o limite. Afirma que quando o objeto da negociação é a dívida ativa, o uso desse benefício excepcional exige a irrecuperabilidade do crédito. “É que, do contrário, haveria renúncia de receita porquanto o crédito, a partir do critério objetivo que é a capacidade de pagamento (Capag), seria recuperável”, diz.

A classificação da Fazenda Nacional sobre a capacidade de pagamento do contribuinte tem sido o ponto sensível nas transações, dizem advogados tributaristas.

Em um contexto de questionamentos sobre o assunto, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional decidiu tornar mais transparente o cálculo realizado para medir a capacidade de pagamento dos contribuintes. Também vai abrir, no site do órgão, um caminho para que possam questionar os enquadramentos. As mudanças estão na Portaria PGFN nº 1.241.

“As alterações dão ao contribuinte mais chances de alterarem seu rating, de forma a possibilitar a utilização do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL”, afirma Sergio Villanova Vasconcelos, que aponta ainda situações de clientes que possuem rating alto, mas não têm liquidez para conseguir quitar as dívidas.

Os advogados do Buttini Moraes também analisaram o conteúdo dos acordos em que houve sinal verde para uso de prejuízo fiscal. Apenas quatro das 66 transações firmadas este ano não fazem qualquer referência à capacidade de pagamento do contribuinte.

Na maioria dos casos (65%), há classificação dos débitos como irrecuperáveis ou de difícil recuperação. Em outros 28,3% há menção de que a situação econômica do contribuinte foi levada em conta.

O advogado Paulo Henrique Gomes da Costa, do Medina Guimarães Advogados, entende que os critérios para uso dos créditos deveriam ser mais objetivos. “Criaria um direito para o contribuinte. Hoje, é subjetivo, é uma possibilidade outorgada à procuradoria”, diz. Em muitos casos, acrescenta, “o que está na análise da procuradoria não reflete a realidade e o dia a dia do contribuinte”.

Segundo Richard Edward Dotoli, sócio do escritório Costa Tavares Paes e professor na FGV-RJ, o empresariado tem resistido a fazer desembolsos de caixa diante de incertezas econômicas. Ele cita as indefinições sobre aumento de receita para cobrir o rombo das contas do governo e da alíquota do imposto sobre bens e serviços depois da reforma tributária.

“É preciso que venha do governo o estímulo capaz de convencer o contribuinte a sacrificar o fluxo de caixa”, afirma.

A Fazenda Nacional diz que “está perpetuamente atenta às necessidades e oportunidades na promoção da justiça fiscal, o que também envolve maior estímulo à celebração de transações”.

Cita que, desde o início das transações em 2020, mais de 1,9 milhão de acordos foram fechados, com valores que chegam a meio trilhão de reais. “Esses dados demonstram o grande sucesso e aceitação do instituto da transação tributária pelos agentes de mercado e pela comunidade jurídica”, diz.

Fonte: Valor Econômica